10 fevereiro, 2007

Racismo (II)

Um comentário deixado à minha nota precedente sobre o racismo fez-me ir ler a crónica de Clara Ferreira Alves, no último Expresso, "A praga chinesa". Começa logo pelo título, de muito mau gosto. Obriga-me a alguma escrita, que há coisas que não se podem deixar passar em claro, quando escritas com grande difusão e por uma pessoa que até, normalmente, gosto de ler.

Vou correr o risco, espero que bem controlado, de fazer citações retiradas do contexto. O contexto, neste caso, é importante, o da critica a uma sociedade aparentemente sem escrúpulos, contraditória, que pretende conjugar a modernidade económica com o maior atraso politico e do respeito pelos direitos humanos. No entanto, julgo que isto não desculpa que, a propósito, se escrevam coisas como as seguintes, para mais ofensivas de uma nossa comunidade imigrante pacífica, trabalhadora, que não tem nada a ver com os desmandos do regime chinês. Que se diria de um artigo do mesmo tipo, nos anos 60, num jornal francês, misturando salazarismo e colónia portuguesa em França?
(...) não podemos negar que os chineses se interessam violentamente pelo território português nos últimos anos. Violentamente, a meu ver, porque as lojas com lanternas vermelhas à porta, género «papier machê», são as lojas mais esquálidas e desgraçadas que alguém se lembraria de implantar em território europeu.
(...)
Por qualquer razão que me escapa, que nos escapa e que, diz-se à boca pequena, tem a ver com os interesses colonizadores da China e a nova versão do perigo amarelo, as lojas chinesas reproduzem-se como coelhos por esse Portugal fora, e no Alentejo abrem exacta mente no mesmo lugar onde fecharam, por falta de clientes, as lojas portuguesas. Vêem-se lojas chinesas à beira da estrada, nas ruas principais, nos centros comerciais. Vêem-se lojas chinesas encostadas a restaurantes chineses e sem estar encostadas a restaurantes chineses, cobertas de flores de plástico e de cartazes a dizer que está tudo a menos de 1 euro, ou de 10 euros, ou qualquer quantia irrisória. Lá dentro é o bazar desarrumado e sintético, exemplo milagroso do crescimento económico destinado a produzir lixo. As lojas chinesas são inestéticas, são concorrência desleal e estão a matar o equilíbrio do mercado e das lojas tradicionais portuguesas. Se esta frase parece racista é provavelmente porque ela é racista [JVC: e é!].
(...)
Na verdade, é impossível não perguntarmos o que diabo fazem tantas lojas chinesas em território português e quem sustenta e apoia estes comerciantes que resolvem vir para Portugal e para uma região de Portugal que está nos antípodas da sua sensibilidade, como o Alentejo. Quem sustenta e apoia estes imigrantes que não sabem falar português e que não são de Macau nem são sobras do império, e lhes diz para vir inundar zonas economicamente deprimidas com quinquilharia ambulante. A China, além de poluir a terra (e toda a gente sabe que já não se consegue respirar em Hong Kong), polui o mundo com o seu modelo de negócio. Talvez pudéssemos retribuir abrindo umas lojas de pastéis de bacalhau e galos de Barcelos na China, mas, até lá, somos inundados com óculos de ver ao perto, rosas artificiais, brinquedos, vestidos de poliéster, cabides, bugigangas, enfeites, paisagens amarelas e cor-de-rosa, sacos, tapetes, sapatos, altifalantes, relógios, colares, contas, cartas... e montras de entulho.
Já tenho escrito muita asneira, mas creio que nunca mais sairia de casa, escondido com vergonha, se me tivesse saído uma coisa destas.

1 comentário:

lino disse...

Eu deixei há muito de ler essa senhora. Desde que começou a fazer fretes ao Santana, como "paga" de ele a ter colocado à frente da Casa Fernando Pessoa. Pobre poeta, que deve ter-se revolvido no túmulo.