08 fevereiro, 2007

Rigor científico

Tinha dito que não voltava ao debate científico, mas há coisas que são demais. Uma investigadora portuguesa, radicada na Inglaterra, publicou há algum tempo um artigo científico demonstrando que o feto de 16 (!) semanas já tem reacção à dor. Não conheço o artigo, mas a revista é reputada.

Simplesmente, vem agora participar na campanha do "não", afirmando haver "evidência" de que o mesmo já se passa às dez semanas. Há aqui uma má tradução do "evidence" que, apesar de incorrectamente, aparece em alguns artigos com o sentido de quase-certeza, ou sugestão muito forte, embora falte a prova experimental. Por isto, não é admisível, num artigo, apresentar esses dados no capítulo de "resultados", mas é frequente usá-los na "discussão", mas sem que isso passe a constituir "verdade" científica.

Alguém a questionou sobre o significado do seu uso de "evidência". Confessou que os dados que tinha eram apenas "sugestivos". Toda a gente, em ciência, sabe o que isto quer dizer. "Tenho um palpite, não tenho provas, mas deixa-me escrever, para ter algum crédito se isto se vier a demonstrar".

Quando se faz manipulação política ou ideológica, quando se torce a moral, quando se faz proselitismo religioso, está-se no domínio do jogo social, que devia ser só de "fair play" mas em que se dá muita canelada. Quando se violenta a ciência e a racionalidade, está-se a pôr em risco o que de mais nobre e avançado tem a civilização. Quando isto é feito por um cientista, é execrável.

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