21 fevereiro, 2007

Espanha, aqui tão perto

Uma nota anterior transcrevia algumas observações de Miguel Sousa Tavares sobre a nossa diferença com a Espanha. O registo era jocoso, mas parece-me que justifica uma discussão mais a sério, embora eu não tenha credenciais para isso. Vivemos décadas de fascismo comum, de miséria, de atraso. Porque é que hoje somos tão diferentes?

Vamos às origens, que logo nos distinguem. É verdade que tivemos uma matriz comum, celtibérica (Viriato é tão português como espanhol), romana, visigótica, moura. Há uma pequena diferença, que não sei discutir, a influência sueva, só em Portugal. Diferença mais marcante é que a reconquista começa na actual Espanha muito antes da que ocorre no actual Portugal. Creio que isto significa que, nessa época, as estruturas sócio-políticas feudais específicas da reconquista começam a afirmar-se muito mais em Leão, sendo apenas um reflexo periférico no território que hoje é Portugal.

Por outro lado, para desgosto do nosso orgulho, parece-me evidente que a resistência moura sempre foi muito mais forte em relação a Leão-Castela do que a Portugal. Os míticos reis mouros de Ourique devem ter estado muito longe, em poder, do que Afonso VI defrontou na tomada de Toledo.

Saltando séculos, outro aspecto essencial, o da construção do estado. Emparelharam, D. João II e os reis católicos, mas estes mantiveram a herança, enquanto que o nosso D. Manuel voltou a favorecer a nobreza. Mais importante, a nova Espanha unificada tem uma dimensão europeia, com a ligação à casa de Áustria.

A seguir, a expansão. Também aí uma grande diferença. Nós fomos descobridores e comerciantes. Só nos aventurámos nas bandeiras brasileiras e um pouco em Angola. Os espanhóis foram conquistadores. O nosso império foi de caricatura, uma pequena faixa costeira, o espanhol foi o de todas as américas, do ouro e da prata. Lembro aqui uma curiosidade, coisa que me dizia um grande amigo espanhol. "Os portugueses basearam-se em fidalgos da corte, nós em aventureiros duros, principalmente gente da seca Estremadura".

Outro grande salto para os tempos agónicos dos dois fascismos. No fim dos anos sessenta, nós estávamos apantanados na guerra colonial, os espanhóis conseguiram que Franco, apesar de provavelmente muito mais estúpido do que Salazar, abrisse portas em vida a um "marcelismo" do Opus Dei que, cá, foi uma coisa patética.

Tudo isto é charla de amador. Importante é ir a Madrid ou a Barcelona, ver e pensar. Ou, mais proximamente, ver no dia-a-dia o que é hoje o domínio espanhol da nossa vida quotidiana. Não é preciso saber ler os suplementos económicos dos jornais. Espanha, não há nada com quem eu tenha uma tão óbvia relação de amor-ódio!

1 comentário:

M.C.R. disse...

Meu caro JVC

suponho que os suevos não tiveram qualquer importancia no fundo populacional português. eram muito poucos e foram absorvidos rapidamente. De resto o mesmo se pode dizer dos visigodos. Tinham um direito próprio enquanto os indígenas se regiam pelo romano, romanizaram-se no possível, de resto já vinham com um toque desses na asa, que a peninsula não foi exactamente o seu primeiro lar no Ocidente.
A Espanha teve de facto a seu favor o ser uma verdadeira potência europeia muito cedo. Tinha gente e espaço. O Império espanhol durou apesar de tudo e mesmo destruido prolongou-se com a influencia na Itália e o império colonial. Ou seja a Espanha foi sempre um país com importancia na Europa, o que não avconteceu com+nosco. Quanto aos tempos mais recentes as razões são claras: território, espaço economico próprio e população. Isso justifica que mesmo ainda no fim do franquismo a espanha fosse já uma peça importante no jogo europeu. coisa que nunca se passou conosco. Assim parece claro que hoje esteja onde está e nós ali tão perto estejamos onde estamo. A restauração se calhar não foi nenhum bem. Saímos de uma monarquia dual para nos tornarmos num pequeno entreposto dos ingleses que por isso nos ajudaram a sacudir os espanhois. E para sermos uma espécie de aliados menores dos bifes. E mal tratados...