Prometi que voltaria ao discurso de António Nóvoa, reitor da U. Lisboa, e em particular a duas suas afirmações polémicas. Começo por uma que deu maior brado: "O governo transfere anualmente para universidades norte-americanas, ao abrigo de acordos interessantes mas com contrapartidas reduzidas, verbas superiores às que transfere para algumas universidades portuguesas". À primeira vista, sou tentado a apoiar esta afirmação, mas admito que ela talvez tenha sido um pouco precipitada (mas até o Papa, lembram-se?).
AN talvez não tenha previsto que boa parte das críticas que esta afirmação suscitou são de difícil resposta. Não se baseiam em factos e números, são evidentemente desabafos ou pressões por tabela dos pequenos interessados deste país pequeno nas pequenas benesses dos tais acordos internacionais. Contra críticas dessas não há argumentos. Por outro lado, creio que ainda é cedo para se fazer um balanço objectivo dos custos-benefícios do chamado programa MIT. Desde já, parece-me que alguns indicadores são preocupantes. Há dias, li num jornal a notícia dos primeiros mestrandos e doutorandos inscritos no programa. Lamento não ter guardado o recorte e não poder citar exactamente o número, mas lembro-me de que era risível.
De qualquer forma, parece-me que o mais importante que AN quis dizer foi que há universidades portuguesas em estado de coma financeiro, com ou sem programa MIT. Muito poderia referir, mas, para não maçar o leitor, aqui ficam apenas alguns dados exemplares. Ainda falta um mês para o fim do ano e o pagamento de ainda outro mês de salários, o subsídio de Natal. No entanto, quatro universidades, Açores, Évora, Algarve e Trás-os-Montes, não têm verbas para essas despesas de pessoal, mesmo que deixem por pagar água, electricidade, telefones e tudo o mais.
É certo que este colapso financeiro pode ser mitigado pelos previstos contratos de saneamento financeiro, mas isto é abrir a porta a um financiamento discricionário, que não é nenhuma de duas modalidades aceitáveis de financiamento. Não é um financiamento objectivo por fórmula (contra o qual muito tenho escrito) nem é um financiamento valorativo e programático (que defendo).
Repare-se que não são quaisquer universidades. Uma é um instrumento decisivo do desenvolvimento de uma região muito especial, insular. Outra é a única universidade interior de uma populosa região, do Norte. As outras são as duas únicas universidades de todo o vasto território a sul do Tejo.
Pior é que, para 2008, os orçamentos previstos para oito das catorze universidades públicas portuguesas não cobrem sequer as despesas de pessoal. Novamente, para além de outras, são aquelas universidades as que continuam a ficar em situação muito problemática. No caso mais grave, dos Açores, o orçamento total só cobre 92% das despesas salariais.
Este quadro não admira, quando se vê que a dotação para 2008 aumenta apenas, nominalmente, de 0,68%. Não sei qual é a previsão da inflação, mas pode-se ter uma ideia pela proposta governamental de aumentar os salários da função pública em 2,1%. Se for assim, as universidades e politécnicos vão ter uma descida real de 1%.
Nota final - Chamo a atenção para que a afirmação de AN tem vindo normalmente truncada do que afirmou em sequência e que merecia boa reflexão: "Desenganem-se todos aqueles que acreditam ser possível plantar duas ou três escolas de excelência num terreno institucional degradado. A excelência não nasce por escolha nem por decreto, mas por boa sementeira em terreno fértil."
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1 comentário:
Não resisto a dizer aqui que, do meu ponto de vista, e concordo com a OCDE*, nos está a fzer mesmo falta só o 'terreno (solo) fértil'.
Quando a OCDE nos disse exactamente isto, de outra forma*, não estavam a pensar em formações de topo da hirarquia de uma hipotética excelência, com o "preço por unidade - de cada uma das suas excelências futuras", se o chegarem a ser, andará pela hora da morte dos restantes.
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*"Fostering human capital development in Portugal" (2006), ECONOMICS DEPARTMENT WORKING PAPERS No. 505 de Stéphanie Guichard and Bénédicte Larre, no endereço abaixo. http://www.olis.oecd.org/olis/2006doc.nsf/43bb6130e5e86e5fc12569fa005d004c/157b75cb9c3ccf0bc12571c00047d64a/$FILE/JT03212365.PDF.
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