Jorge Miranda (JM) é para mim um bom exemplo do nosso conservadorismo universitário, muito evidente na tradição particular das escolas de direito e de letras. Hoje, no Público, protesta contra o uso do inglês em diversas actividades universitárias. Não vou gastar muita cera com esse defunto, apenas algumas anotações.
1. O que se propõe como generalização do ensino em inglês refere-se apenas ao segundo ciclo, o mestrado. Tudo indica que será cada vez mais o nível de estudos mais internacionalizado, mais promotor da mobililidade, mais atraente para estudantes não europeus. Não é razão sobeja para o uso do inglês, a língua franca actual? Se uma empresa portuguesa quiser fazer uma grande campanha de promoção no mercado internacional, vai publicar anúncios em português?
2. JM esquece que, durante séculos, o ensino universitário foi sempre em latim? Em Coimbra, isso era considerado uma traição à língua portuguesa?
3. Marginalmente, JM deprecia os actuais mestrados à bolonhesa em relação aos anteriores mestrados portugueses. A meu ver, não tem razão. O nosso mestrado não era carne nem peixe. Como trabalho de investigação, só tinha algum valor nos casos perversos, como em direito e letras, em que ele era prolongado quase até à duração de um doutoramento. Nas ciências e tecnologias sempre foi, em geral, uma perda de tempo, melhor aproveitado na ida directa para o doutoramento. No fim, sem qualquer impacto no mercado do trabalho, só servia para formar professores do politécnico e para propinas chorudas das universidades.
4. JM refere que "um pouco por toda a parte, já se vão reconhecendo os excessos e os malefícios trazidos por aplicações rígidas do processo de Bolonha". Isto é como eu dizer a um jurista como JM que cada vez mais se reconhece os vícios do código penal por causa das decisões erradas dos juízes. Mas, afinal, JM é coerente, se nos lembrarmos do seu incrível documento quando coordenou a comissão para Bolonha na área do Direito.
5. JM escandaliza-se por haver debates em inglês no conselho científico de uma faculdade. É que essa faculdade, e outras, ao contrário da Faculdade de Direito, não se fica por recrutamento doméstico, tem professores estrangeiros cujo contributo para a política institucional discutida no conselho científico é muito importante. Devem ser afastados da discussão por não falarem português? Já agora, coisa impensável na Faculdade de Direito, há cada vez mais doutorandos orientados por investigadores estrangeiros, que, pela lei, são membros do júri. As provas de doutoramento, neste caso, devem ser obrigatoriamente em português?
15 novembro, 2007
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