Neste livro, M.F.M. conta as peripécias do concurso público lançado pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, em 1870, para a colocação de cônsules no estrangeiro. Fora Jaime Batalha Reis, um grande amigo de Eça, quem lhe falara no assunto, contando-lhe que iria candidatar-se a um cargo diplomático.A célebre frase de Eça sobre Antero recordou-me um episódio interessante que vivi, com o meu venerado amigo Prof. Joel Serrão (JS), com quem eu não podia ter reuniões curtas de trabalho, na Gulbenkian, que não descambassem em horas intermináveis de conversa riquíssima de JS sobre a cultura açoriana e, claro, Antero, que ele sabia ser um ídolo meu de juventude, hoje um dos meus padroeiros.
Eça, formado em Direito, decidiu fazer o mesmo, não se poupando a meter cunhas para obter uma melhor avaliação do que Batalha Reis, o amigo que, contra a resistência de Ramalho Ortigão, conseguiu publicar os folhetins de O Crime do Padre Amaro em A Revista Ocidental.
"Parafraseando o próprio Eça num artigo que escreveu quando o Antero se suicidou, intitulado Um génio que era um santo, eu acho que ele era um génio que não era um santo. Tinha muitas falhas e uma delas era uma certa secura de sentimentos ou, no caso do concurso, de falta de escrúpulos."
Uma vez, em meados dos 90, fomos juntos aos Açores, à universidade, mas com um dia de antecedência, eu porque queria rever alguns velhos amigos, ele porque lhe faltava ainda ver alguns livrtos da biblioteca pessoal anteriana, no arquivo municipal. Ao jantar, JS estava perturbado,com uma descoberta, uma carta perdida entre folhas de um livro do Antero. Antero, que, na fase derradeira de vida até ao dia fatídico do banco do Campo de S. Francisco, só vivia de umas rendas de propriedades rurais de família, escreveu uma carta dura a um rendeiro, reclamando o pagamento de longa dívida, e em termos que JS considerava pouco compatíveis com a santidade e o socialismo de Antero. Nunca vi a carta, só sei o que JS me contou, mas desconfio que foi apenas exagero da extraordinária sensibilidade de JS.
"Ó VC, eu sou historiador, não posso sonegar documentos, mas como é que eu me sinto a contribuir para uma mancha na imagem de Santo Antero?". Nessa altura, saíu-me uma ideia "brilhante". "Sr. Professor, repare. Onde é que descobriu essa carta? Num livro do próprio Antero. É claro que ele não a enviou, é como se não existisse". Creio que aliviei imenso o meu muito prezado Prof. Joel Serrão.
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