18 julho, 2007

Sobre a educação superior (III)

Reitores ou chefes de repartição?

Um concurso para chefe de repartição, na maioria dos casos, envolve um currículo a metro e uma prova escrita, tudo quantificado numa fórmula cega. É isto que os reitores julgaram que ia ser o seu processo de "designação" pelo conselho geral? Não posso crer que sejam tão ignorantes sobre o que é um "search and select" ou que nem sequer tenham conseguido entender a descrição razoável que vem no artº 86º da PL. Merecem que lhes explique como a meninos de escola, até porque, com o meu sucessor na direcção do IHMTropical, creio sermos os únicos dirigentes da administração pública designados por este processo (o de director do ITQB, também da Universidade Nova de Lisboa, é um pouco diferente, porque a decisão compete ao reitor).

Começo pelo "search". É que não é um processo passivo, em que se espera pelas candidaturas. O órgão competente deve promover a procura de bons candidatos potenciais, dar-lhes a conhecer a oportunidade e manifestar interesse na sua candidatura, obviamente sem compromisso. Os elementos do processo de avaliação podem variar mas, normalmente, são: o currículo; uma carta de intenções ou motivações, em que o candidato faz um manifesto moral e intelectual sobre o que realmente o leva a concorrer e demonstra o seu carácter; um programa de acção para o mandato; finalmente, uma entrevista, privada ou pública (como, por exemplo, no senado americano, embora eu prefira a privada, menos sujeita a factores mediáticos). Nunca viram reportagens televisivas sobre este tipo de "exames" no senado americano, por exemplo para embaixadores? Ou serão para chefes de repartição da Casa Branca?!

O que é muito importante neste processo e que parece ser ignorado pelos reitores é que, sendo eles, de qualquer forma, escolhidos pelo conselho geral, seja por este processo seja por eleição simples, como parece ser agora o caso, têm toda a vantagem no primeiro processo, em que o órgão designador fica limitado por ter feito a escolha com base num programa, sujeito a uma apreciação fundamentada, a preceder a decisão. Por exemplo, no esquema previsto na PL, o CG aprova ou não o plano anual e o respectivo orçamento, obrigatoriamente por proposta do reitor. A eventual recusa é um "poder de bomba atómica", como se costuma dizer em relação ao poder presidencial de dissolução. Se um CG o fizer, o reitor não pode deixar de se demitir. Já é muito diferente se ele mostrar que está só a concretizar o programa com que o CG o designou.

Creio que esta visão traduz uma concepção funcional e dinâmica do funcionamento das organizações e do exercício dos poderes. É pena que a universidade cultive antes uma visão formalista e jurídica.

Eu experimentei isto, pessoalmente, na apresentação ao meu conselho geral de propostas difíceis de fazer passar. Este argumento do programa valeu-me por mais de uma vez e até junto de um membro do governo que tinha um representante nesse conselho. Devo dizer que as dificuldades nunca foram com os membros externos, mas sim com os internos, nomeadamente os catedráticos, cujos joanetes doíam com algumas reformas minhas. Isto é outra coisa que discutirei no próximo apontamento. Quanto a este RJIES e ao conselho geral, não estou nada preocupado com os membros externos. O que me preocupa, quanto ao bom funcionamento do modelo, são os internos. Direi porquê.

1 comentário:

Alexandre Sousa disse...

É aqui que se separa a palha do grão!
Grande parte do debate que por aí se escoa está preso por fios e cordas de um corporativismo mal encapotado, mas atenção, mesmo debaixo dos panos este corporativismo é fortemente militante.
Aprecio bastante o seu esforço didáctico até porque burro velho, também aprende. Será?

Aquele abraço