28 julho, 2007

Benchmarking e re-engenharia comportamental

"Quais anti-inflamatórios, qual quê! Obstinada, recalcitrante, lamuriante, autista, tetraplégica mental, preguiçosa e inactiva! A senhora é tal e qual o nosso governo. E, tal como este, é só de um plano austero, implacável de dieta rigorosa e de exercício activo, o que a senhora precisa. Faça alguma coisa de útil por si e pelos outros! Mexa-se!"
Foi com um ralhete destes, que CG, o meu médico de família, definiu o “standard e benchmarking” da minha insatisfatória condição de saúde física e me coagiu a um forçado processo de re-engenharia comportamental.
A humanidade não me merece - é que mesmo depois de ter sido insultada daquela maneira, dei razão ao médico. Assim, há cerca de 8 meses atrás, com humildade e em obediência cega aos conselhos, resolvi ingressar no mundo do desporto de alta competição - a natação e, hoje mesmo, acabo de bater o recorde mundial absoluto dos 2,5 metros em “free style”, seguida de triplo saltito mortal (doentito) em altura, e posterior queda livre sobre lajedo e, tudo isto, em 2.5 segundos, cronometrados e perante testemunhas.

Bom, não será bem, bem natação - em piscinazinha coberta e termo estatizada - o desporto que agora pratico, na verdade, trata-se muito mais de uma chapinhaçãozita individual num tanque de 20 metros de comprimento. É um espaçozinho físico que, sempre partilhei com outras 30 pessoas que fazem colectivamente, sob comando especializado de treinadores, hidroginástica, estridente colectiva, ao som e ritmos de um incansável Inverno de Vivaldi, sempre em último volume, comparável a uma reverberação medida em quase 12 na Escala de Mercali, e que provoca ondas dignas de marés vivas atlânticas.

Perfeitamente extasiada, hoje, atribuí a quietude da água, a desertificação, o silêncio absoluto e sepulcral que envolviam a "minha piscina" e os arredores, ao facto de ser quase Agosto, e das pessoas estarem TODAS de férias.
Pensei para comigo: maa-raa-vii-lhaaa, hoje estou aqui, inteiramente, por minha conta. E…mergulhei de olhos bem fechados (esqueci-me dos óculos de protecção), na água sereníssima e quentinha, de um só fôlego. Não tinha ainda nem dado cinco braçadas, e bati com toda a força de um aríete, com a minha testa num toco de ferro, que ecoou assim: “toiiiiaannggg....gaanngg”.

A minha pulsação - normalmente, mesmo que chovam canivetes, inamovível nas 75 batidas por minuto - disparou lá para umas 200 ou mais! Juro por Deus, que eu não só vi as estrelas, como ainda vi e tropecei em seis pares de pernas pretas, ataviadas com pés de pato (barbatanas), que se encontravam ali flutuando, ao nível no fundo do tanquezinho de 1,20 m de profundidade a treinar… mergulho.

Dá para acreditar?

Gritámos TODOS, eu e os donos das pernas e dos pés de pato, num coro uníssono, diferentes palavrões conhecidos e outros nem tanto!

Contundida e muito baralhada das ideias - ainda não tinha me tinha conscientizado do que tinha, realmente, visto - nadei, nadei… Nadei não, voei, voei os cerca 2,5 metros que me separavam das paredes da piscina, e escalei as escadas, simultânea e instantaneamente - isto é, desmaterializei-me da água, e materializei-me estatelada no chão de azulejos, já fora da piscina, com os joelhos e cotovelos ralados, o galo da testa, a latejar furiosamente (bati com a cabeça numa garrafa de ar comprimido) e a pulsação síncrona.

Escusado será dizer que, já esqueci os insultos do meu médico de família, mas o nome dele, o do responsável pela "piscina" e o do "personal trainer de scuba diving" não, e estes foram devidamente acrescentados ao meu já extenso e imorredoiro rol de inimigos a abater.

O que lhes contei não pode ter sido nenhum atentado, contratado e premeditado, contra a minha integridade física e mental, pois não? Mas lá que resultou....

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