31 janeiro, 2007

Ainda a Esmeralda

Não voltei a escrever sobre o caso da Esmeralda, porque me quero distanciar de atitudes exageradamente emocionais e porque não domino os aspectos jurídicos. É por isto que não respondi a alguns comentários de entradas minhas anteriores.

Apesar desta cautela, tenho duas convicções firmes. A primeira, que me parece indiscutível, é que qualquer "direito" de uma parte ou outra se deve subordinar ao direito absoluto de uma criança de cinco anos de fazer a sua vida nas melhores condições de construção afectiva da sua personalidade. A segunda é a minha convicção de que, verdadeira e definitivamente culpada, neste caso, é a justiça portuguesa, perante um caso que, sabemos agora, é desencadeado quando uma criança ainda tem poucos meses e que agora explode quando ela é uma menina com sentimentos e afectos.

Dou um exemplo, o da prova de paternidade. Li que demorou sete meses. Empenho nesta declaração a minha idoneidade profissional: pode-se fazer em dois dias!

Nesta embrulhada, a justiça recorreu ontem à tentativa de negociação. O pai pretendente, o sargento Gomes, vai ser bombo de festa, por ter bloqueado o que, na brandura dos nossos costumes, parecia uma boa solução. Vejamos: a decisão de atribuição do poder paternal ao pai biológico parece sólida; o sargento só beneficiaria de um acordo, em termos da condenação; se sabe que, no fim, vai ter de entregar a criança, certamente desejará que seja nas condições que o acordo propunha.

Mas, eu que não sou jurista, lembro-me de uma coisa que não vejo escrita nos jornais. Daqui a dias, haverá uma decisão do Tribunal Constitucional que pode pôr tudo isto de pantanas. Então alguém faria outra coisa diferentemente do sargento Gomes, recusar um acordo na incerteza do que será essa decisão? Com tudo isto, repito, para mim só há aqui um réu, o nosso sistema de justiça.

Nota lateral – Um colega meu disse-me que um juiz muito prestigiado lhe tinha dito, a propósito deste caso, que não há qualquer dúvida sobre o papel de um juiz: ler o código, enquadrar nele o caso e aplicar a justiça. Não quero crer, o meu colega deve ter percebido mal. Também é fácil ser piloto de avião, é só saber qual é o botão do piloto automático.

P. S. - Eu bem previa, tudo ainda se podia complicar. O Tribunal Constitucional vem hoje baralhar tudo, aceitando o recurso do sargento Gomes. Só há uma coisa incontornável, o relógio, que soma dia a dia à possível tragédia da Esmeralda. Apetece-me dizer: suspenda-se a justiça, para obras de remodelação.

2 comentários:

Anónimo disse...

O Tribunal Constitucional deu provimento ao recurso da família Gomes

lino disse...

Pois deu e ainda bem, acho eu. A grande diferença entre os pilotos de avião e os juízes portugueses é que os pilotos, para além de fazerem muitas simulações de voo (como os juízes no CEJ), não vão pilotar um avião sozinhos, nem quando saem do simulador nem nunca. Além de que, se errarem, são penalizados, ou com a própria morte ou com outro castigo adequado ao erro, o que não acontece com os juízes.