14 agosto, 2007
Nota gastronómica (XXI)
Ingredientes (in)dispensáveis
Volto aos utensílios (in)dispensáveis. Desta vez é a minha "daubière". Não tenho tradução. É um pote cerâmico que tanto pode ir ao lume como ao forno, mas que tem uma característica essencial, um rebordo largo entre a caçarola e a tampa, que se pode vedar com uma cola tradicional de farinha e água, o grude. Esta minha tem a vantagem adicional de uma cavidade na tampa, para controlo da cozedura, mantendo-se a cavidade da tampa sempre com água.
"Daube", na cozinha tradicional francesa, é um estufado, no forno ou ao lume, muito lento e demorado, a temperatura relativamente baixa e com o recipiente vedado, como disse. Obrigatoriamente, vinho e ervas. Clássicas são a "daube" bearnesa, a provençal e a borgonhesa. Esta, como toda a gente sabe, é um estufado de carne em vinho tinto, com cebola, cenouras, cogumelos (modernice) e batatas. E é sobre a cozinha em vinho tinto que vou dizer alguma coisa.
Nas carnes, temos bons exemplos na cozinha portuguesa, assados, não "daubes", de que vou referir a alcatra terceirense (que, nas casas ricas, se faz com vinho branco, tradicionalmente o verdelho de mesa dos Biscoitos) e a chanfana bairradina, relacionando-as com dois emblemas franceses, o tal "boeuf bourguignon" e o "coq au vin". Vejam só, boi e galo. Experimentem fazer um "coq au vin" com frango e vão ver. É que o vinho tinto obriga a cozinhado lento – "no se puede hacer mas lento" - e, portanto, a carne que não se desfaça entretanto. E alguém já experimentou fazer uma chanfana de cabrito?
Isto deixa-me alguns problemas com uma coisa de que gosto muito, o frango na púcara, à moda de Albobaça. Pelo que disse, faço-o sempre com um vinho branco leve mas bem vincado de sabor, para que, no fim de um assado forçosamente breve, não haja gosto a vinho fresco. Não vou dizer qual o vinho, apenas que o meu favorito não fica muito longe de Alcobaça, que já foi um célebre vinho de mesa e que hoje está esquecido. Alguém adivinha?
P. S. (11:15) - Chamaram-me a atenção para um pormenor da daube provençal que eu desconhecia. Manda a tradição que a dauvière seja lavada sem esfregar demais, como o alguidar de alcatra terceirense. Vai ficando alguma patina de daube para daube. Nem o mestre Escoffier indica esta recomendação, mas, com a minha experiência da alcatra, vou por ela.
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