29 agosto, 2007

Do infantário à universidade

As notas sobre a educação superior têm sofrido com a época de férias, o que não quer dizer que o texto seguinte não seja bem importante.
- Não percebes? - perguntou Siminov. - O miúdo nunca vai ser aceite em nenhuma universidade decente. Então na Ivy League é que não entra de certeza.
- Só por causa disto, Dmitri Siminov? O infantário tem assim tanto impacto na educação universitária?
- Eu não sou de citar nomes - disse Siminov -, mas, há muitos anos, um banqueiro de renome não conseguiu inscrever o filho num jardim-de-infância muito bem cotado. Parece que houve um escândalo qualquer com a capacidade do miúdo para pintar com os dedos. A verdade é que o miúdo, depois de ser rejeitado pela escola escolhida pelos pais, foi forçado a...
- A quê? Diz-me, Dmitri Siminov!
- Digamos simplesmente que quando fez cinco anos foi forçado a frequentar... uma escola pública.
- Quer dizer que não há Deus - desabafou Boris Ivanovich.
- Aos dezoito anos, os seus ex-companheiros entraram todos em Yale ou em Stanford - prosseguiu Siminov -, mas este pobre diabo, nunca tendo adquirido as credenciais necessárias num infantário... como direi... de estatuto adequado, só conseguiu ser aceite numa faculdade de barbearia.
- Condenado a aprender a aparar bigodes - chorou Boris Ivanovich, imaginando já o pobre Mischa de bata branca, tosquiando os mais abastados.
- Não tendo formação substancial em áreas como decoração de queques ou caixa de areia, o rapazinho estava totalmente impreparado para as crueldades que a vida lhe reservava - continuou Siminov. - Por fim, trabalhou em tarefas manuais, acabando finalmente a praticar furtos no local de trabalho para sustentar o seu alcoolismo. Por essa altura, era um bêbado irrecuperável. É claro que os pequenos furtos conduziram aos roubos, e terminaram no assassínio da sua senhoria, com desmembramento. Antes de ser enforcado, o rapaz atribuiu tudo ao facto de não ter conseguido entrar no infantário certo.
Quem é que podia ter escrito isto? Claro que Woody Allen, no seu último e recente livro, "Pura anarquia".

1 comentário:

Alexandre Sousa disse...

Fabuloso! & temo que verdadeiro demais.