20 outubro, 2008

Eutanásia e suicídio assistido (II)

As questões subjacentes à utilização da eutanásia e do suicídio assistido são fascinantes. Se desejarmos tomar uma posição sobre a legitimidade moral de colocar termo a uma vida humana ou aceitar que uma pessoa coloque fim à sua existência com a ajuda de terceiros, teremos que meditar em questões morais profundas para as quais não existem respostas fáceis ou imediatas. 

Gostaria de assinalar um paralelismo com a interrupção voluntária da gravidez (IGV). Os adversários da IGV por norma argumentavam que praticar um aborto era moralmente equivalente a matar uma pessoa. Se sustentarmos que um embrião é uma pessoa humana esta conclusão é perfeitamente aceitável. Pessoalmente não creio que assim seja, embora reconheça que existe algo de arbitrário em definir um tempo de gestação a partir do qual a IGV é proibida e moralmente censurável. Os argumentos religiosos foram raramente invocados. 


No que respeita à eutanásia e ao suicídio assistido os argumentos religiosos estão lá, embora com outras vestes. Como disse na entrada anterior sobre este tema, o Presidente Nicolas Sarkozy afirmou a Rémy Salvat que "por razões filosóficas pessoais (…) não temos o direito a interromper voluntariamente a vida." Ora, isto não é um argumento filosófico. Poderá ser a conclusão ou a introdução a uma argumentação filosófica, nunca a sua substância. A razão pela qual sustento que o principal argumento contra a eutanásia e o suicídio assistido é de natureza religiosa é que ele pode ser formulado da seguinte forma: temos o dever de viver independentemente da nossa qualidade de vida. E por que razão temos esse dever? Basicamente porque a nossa vida não nos pertence, mas pertence ao nosso criador, ou seja, a Deus.


É óbvio que existem outros argumentos que são invocados contra a eutanásia e o suicídio assistido. O mais comum é o de que as pessoas em situação terminal, como Chantal Sébire, não desejariam morrer caso tivessem acesso a cuidados paliativos que minorassem o seu sofrimento. Mas este argumento não responde à questão moral que está em jogo.


Pessoalmente defendo o suicídio assistido em casos em que os indivíduos se encontram em estado de sofrimento físico ou psíquico, em função de circunstâncias várias, com base no seguinte argumento: os seres humanos não têm o dever de viver mas sim o direito de viver. E tendo esse direito podem suspendê-lo caso se encontrem na plena posse das suas faculdades mentais e se a sua decisão resultar de um processo longamente amadurecido. Por outras palavras, defendo a autodeterminação consciente da vida de cada um, incluindo a possibilidade de lhe colocar cobro.
Esta posição resolve alguns problemas mas cria outros. Por exemplo, se uma determinada pessoa não está em condições de escolher de forma consciente, quem toma a decisão por ela? Penso, em concreto, no caso de crianças que sofrem de doenças graves, incuráveis e geradoras de grande sofrimento ou mesmo no caso de adultos que, padecendo das mesmas doenças, são incapazes de tomar uma decisão consciente (pessoas com debilidade mental profunda, por exemplo). Nesse caso sustento que as decisões devem ser tomadas por quem tem a custódia legal sobre a pessoa, como sucedeu no caso de Terri Schiavo, embora neste caso a morte tenha surgido na sequência da falta de alimentação e hidratação.

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