31 janeiro, 2008

Cuidado com inovações, porque a roda já tem mesmo patente

Fico muito desconfiada de pessoas e/ou instituições que, sempre que fazem qualquer coisinha da qual pura e simplesmente desconhecem os percursores se auto-nomeiam como pioneiros e, de preferência, os seus anúncios sobre a suposta inovação são propalados para uma qualquer plateia de comunicação social, menos cuidadosa e deslumbrada.
Novidades velhas têm o condão de me irritarem, sobretudo, quando se pretende desvanecer protagonismos alheios pouco convenientes....
Esta semana, o senhor Paulo Ferrão, identificado como director português do programa MIT-Portugal, tem a distinta lata de dizer publicamente, durante um entrevista concedida à RTP2, que "a atribuição de diplomas conjuntos é uma novidade em Portugal"- confirmar num vídeo publicado pelo Blog de Campus.

Dava-lhe jeito ser "proprietário" dessa inovação, senhor Paulo Ferrão? Que peninha! Atrasou-se uns anos!

Essa dos diplomas conjuntos pode ser uma novidade para algumas pessoas mas, em Portugal, não é! Antes pelo contrário, é já velhíssima (12 anos)!
Essa novidade foi de facto uma novidade, em Portugal e na Europa, em 1996, quando se iniciaram negociações para o curso (Europeu) de Informática do Instituto Superior de Engenharia de Coimbra, que veio a ter os seus primeiros alunos formalmente inscritos, salvo erro no ano 2005/2006, tais foram os atropelos oriundos de todos os azimutes, para a institucionalização do referido curso de formação inicial.
Mãe de todos os azares, Senhor Paulo Ferrão, trata-se de uma instituição politécnica ....

Caro senhor Paulo Ferrão da próxima vez, que quiser anunciar novidades deste teor, informe-se previamente, na DGES, no MCTES ou nos registos do GPAERI, ex-OCES, ou estas possibilidades de se documentar, devidamente, sobre estes assuntos, para o Senhor, são também novidades?

E já agora, antes que haja mais mais outra qualquer tentação nacional, à cautela, e para os devidos efeitos, divulgo aqui que a patente da roda é Australiana também foi já publicada em 2 de Agosto de 2001.

29 janeiro, 2008

Decapagem de percentagens

Hoje, também no Jornal Público, publica-se uma boa notícia: "Para elucidar sobre as saídas profissionaisGoverno vai divulgar lista de empregabilidade dos cursos".
Não vou voltar a referir a confusão que por aí grassa sobre o conceito de empregabilidade, mas penso ser muitíssimo importante que se publiquem, regularmente, informações sobre a dinâmica de emprego, emprego não trabalhos disponível, para os formandos da educação superior.
Pode ser que agora se consiga iniciar a decapagem das percentagens.
Se as informações que irão disponibilizar não resultarem em filtragens distorcidas* - porque, com a necessidade de ascendermos a melhores posicionamentos nos "rankings" estatísticos internacionais, nunca se sabe, divulgam-se percentagens de tudo...- podem ser, efectivamente, muito úteis. Fiquemos, então, atentos.
_______
* Exemplos de formações com "empregos" supérfluos: as que só conduzem a empregos nas próprias instituições em que se lecionam, ou em empresas pseudo privadas financiadas/subsidiadas pelo orçamento de estado, como agora também se cá usam..., etc., etc.,...

A coisa está preta...

O título reproduz o de uma mensagem enviada por um amigo, professor da Universidade de Évora. Apesar das minhas actuais limitações de escrita (creio que só por mais duas semanas), não posso deixar de chamar a atenção para esta corajosa mas dramática mensagem do reitor da Universidade de Évora, Jorge Araújo.

Iliteracia básica?

Hoje, no Jornal Público, João Pedro Pereira assina um artigo de conteúdo alarmante intitulado: "Universidades concentram-se nas competências tecnológicas". "Empresas de tecnologia com falta de profissionais que saibam escrever", pelo qual descreve, sumariamente, alguns extractos de um estudo realizado Associação Nacional de Empresas de Tecnologia de Informação e Electrónica (ANETIE).
Pelos vistos, "as instituições de ensino falham em oferecer formação naquilo a que o estudo chama "soft skills": domínio da língua, técnicas de marketing e negociação ou pensamento crítico, por exemplo."
.....
Para finalizar, diz-se no artigo: O responsável criticou, contudo, as instituições de ensino que não oferecem uma formação adequada durante o primeiro ciclo de ensino e que procuram fazer com que os alunos se vejam forçados a enveredar pelo mestrado.
Fernando Fernández (alguém da ANETIE) acrescentou ainda haver "pessoas que saem de boas universidades sem saber fazer nada de prático".
.....
Se corresponder à realidade, é bastante preocupante, tanto mais que não sei se, entre nós, na generalidade das instituições de educação superior, apenas retorcemos questões importantíssimas de Bolonha, ou se o Processo correspondente foi, simplesmente, amarrotado....

27 janeiro, 2008

Plágios (II)

O Público de hoje traz três páginas dedicadas ao plágio. A Internet introduziu uma nova dinâmica ao fenómeno. É hoje mais fácil plagiar mas apanhar um plágio também se tornou mais acessível para os professores que o desejem. A utilização de programas informáticos especificamente criados para detectar o plágio veio dar novas ferramentas para identificar trabalhos plagiados.

O plágio não pode ser unicamente combatido pela via repressiva. Concordo com Pedro Lourtie quando afirma que se torna necessário introduzir códigos de conduta nas instituições do ensino superior.

Todavia, tal como a existência de leis não assegura o seu cumprimento, também a simples existência de códigos de conduta não será suficiente para o plágio desaparecer. Por isso sou favorável à aplicação de penas dissuasoras do plágio. A questão reside em saber quais as penas a aplicar.

Quando deparei com os trabalhos plagiados que referi numa entrada anterior fui reler as normas de avaliação em vigor na minha faculdade. Num dos seus artigos pode ler-se que “(…) em caso da fraude comprovada deve esta ser comunicada ao Conselho Pedagógico para eventual processo disciplinar.” Porém, nas competências do Conselho Pedagógico não consegui encontrar nenhuma referente à instauração de processos disciplinares. Aparentemente o Conselho Pedagógico não o poderia fazer.

Sabia que o Senado da minha Universidade tem uma secção disciplinar para a qual poderiam ser remetidos os casos de plágio. Fui investigar. Na página da Universidade surge então o documento legal que serve de suporte a uma eventual sanção disciplinar. Num primeiro momento não consigo acreditar no que estou a ler. O documento em causa é o Decreto 21:160 do Ministério da Instrução Pública de 1932 assinado pelo então Presidente da República António Carmona…A infracção disciplinar é definida como “(…) todo o acto ou omissão contrária aos deveres dos alunos, designadamente a prática de actos de manifesta hostilidade contra o Poder Executivo”. A exclusão da frequência da universidade por período superior a três anos e a exclusão definitiva de todas as escolas nacionais aplicam-se a casos de “(…) insubordinação grave, desrespeito ao Presidente da República, aos membros do Poder Executivo e propaganda de ideias dissolventes”.

Fiquei mais tranquilo quando soube que esta peça arqueológica foi revogada pela Lei n.º 62/2007, de 10 de Setembro, que estabelece o regime jurídico das instituições de ensino superior. 75 anos de uma lei instaurada no período da ditadura militar chegaram finalmente ao fim!

26 janeiro, 2008

Mexericos - diz que não me disse....

É assim:
Uma respeitabilíssima penca de 9 avaliadores internacionais de centros de investigação, daqueles da FCT, fez anteontem, uma avaliação in loco a um centro de investigação de uma determinada área científica. E não é que - durante todo processo, que se prolongou por um dia inteiro, foram extremamente objectivos, corteses, rigorosos, atentos, precisos, francos e preparadíssimos - trabalhinho de casa (demasidamente) bem feito - e, dois dos elementos do team são também detentores de currículos pessoais, passíveis de serem e deverem ser lidos de joelhos....
Pois é, comportaram-se como uma verdadeira equipa de avaliação que, por sua vez, mereceria neste seu primeiro round, um quase, quase 20, na escala de Zero a 20, em qualquer lado deste planeta - quero dizer com isto, nem parecia ter sido coisa organizada pela FCT ou, vai-se a ver, esta enganou-se.... mas, nem isso,... é que a referida equipa fez-se acompanhar, por uma colaboradora da FCT, igualmente, atenciosíssima, prestável, competente e muitíssimo profissional.
Quem não está acostumado, estranha, não é mesmo?
Os meus caros e raros leitores não acham que isto que lhes contei seja possível, pois não?
Também eu!
Mas, acreditem-me, foi mesmo verdade! Ou isso, ou a referida equipa hipnotizou, colectivamente, para cima de uma centena e tal de pessoas.
Fiquem atentos, deve valer bem a pena sabermos os desenvolvimentos das cenas dos próximos capítulos deste seriado. Estes, porém, nunca terão lugar antes de Junho.

23 janeiro, 2008

Plágios (I)

Final do primeiro semestre. Na última semana de aulas, numa disciplina com mais de 200 alunos (!!!), que asseguro juntamente com outra colega, os estudantes entregam os seus trabalhos de grupo. São maioritariamente do 1º ano. Esta componente de avaliação é responsável por 50% da classificação final não podendo ser inferior a 7,5 valores. Os alunos foram várias vezes avisados que qualquer situação de plágio implicaria automaticamente a atribuição de 0 valores e a consequente reprovação na disciplina, só podendo apresentar-se ao exame de recurso mediante a entrega de um novo trabalho.

Dos 22 trabalhos entregues 6 continham partes plagiadas Um deles é constituído por um plágio da primeira à última página. Os plágios são muito canhestros. Na maioria dos casos a fonte plagiada é citada na bibliografia, o que revela reduzida sofisticação.

Sou contactado por um aluno que foi informado de que não poderia apresentar-se a exame na época normal. Sente-se injustiçado porque a origem do plágio não partiu dele. Exige consultar o trabalho para confrontar o elemento do grupo responsável pelo plágio. Não entende a razão pela qual a responsabilidade é do grupo e não pode ser individualizada. É-lhe dito que o trabalho de grupo implica todos os membros que o constituem e que numa disciplina com mais de duas centenas de alunos a atribuição de responsabilidades individuais é uma tarefa impossível.

Nas várias mensagens que me enviou é perturbador ler o seguinte:

"(…) desconheço o critério de identificação de plágio. Parece-me que existe um para cada disciplina. Pelo menos é o que eu tenho verificado. Não quero acusar ninguém nem citar nomes, mas já vi trabalhos totalmente baseados em "copy" e "paste" [retirados] da Internet serem bem recebidos por professores. Deveria haver um único critério e este [deveria] ser aplicado a todos de igual forma. Acredito que se isso acontecesse, haveria sérios problemas não só na nossa faculdade, mas no universo académico em geral, devido às proporções que o cancelamento de trabalhos assumiria."

22 janeiro, 2008

Crying times

Definitivamente, ando a observar o mundo da educação superior nacional, com outros olhos...
Tenho-me achado a concordar com os gestores de topo.
Isto pode lá ser? Pode sim. Querem ver?
Agora mesmo, por exemplo, acabei de ler no Blog de Campus, a seguinte notícia de ontem: "O presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), Fernando Seabra Santos, considera "infelizes" as declarações que Mariano Gago proferiu na semana passada, nas quais o ministro argumenta que "as universidades que têm muitas interrogações não estão naturalmente em condições de se autogerir de uma forma tão avançada como é prevista" no modelo de fundação." ??!!??!
E, acreditam os meus caros e raros leitores, que quase dei toda a razão ao Senhor Presidente do CRUP?
Disse quase, porque só não dei toda a razão ao Senhor Presidente do CRUP porque, a meu ver, não são as declarações do Senhor Ministro ou mesmo o Senhor Ministro que foram ou são infelizes....
Ainda não estava eu refeita dessa notícia, e tropecei logo noutra, desta feita, no Diario Económico online, Edição Impressa, com esta magnífica declaração: Governo pede para fecharem cursos. ??!!??!
Adiante, nesta mesma notícia, ainda se refere: "As sugestões que o Ministério de Mariano Gago faz às Universidades com mais dificuldades orçamentais passam pelo encerramento de cursos, suspensão de contratações de professores e congelamento das licenças sabáticas". ??!!??!
Fiquei na dúvida, por isso, fui reler a LEI ORGÂNICA DO MINISTÉRIO DA CIÊNCIA, TECNOLOGIA E ENSINO SUPERIOR, Decreto-Lei n.º 214/2006 de 27 de Outubro.
Artigo 14.º.
"Direcção-Geral do Ensino Superior
1 - A Direcção-Geral do Ensino Superior, abreviadamente designada por DGES, tem por missão assegurar a concepção, execução e coordenação das políticas que, no domínio do ensino superior, cabem ao MCTES.
2 - A DGES prossegue as seguintes atribuições:
a) Apoiar a definição das políticas para o ensino superior, nomeadamente nas vertentes de definição da rede, do acesso e da acção social;
b) Preparar e executar, sem prejuízo da autonomia dos estabelecimentos de ensino superior, as decisões que cumpre ao MCTES tomar no que respeita àquelas instituições;
.....
g) Proceder ao registo dos cursos ministrados no ensino superior;
......
_____________
Mas, afinal quem, e a que nível se precisa decidir sobre que cursos podem ou não funcionar?
Como se devem gerir os Recursos Humanos das Universidades?
E, já agora, por favor, relembrem-me lá (porque velhice é uma coisa triste...), aonde está publicado o tal "modelo" da fundação?
_________________
Não Senhor Presidente do CRUP, não são de facto infelizes nem as declarações do ministro ou sequer o próprio, somos nós mesmos, os cidadãos comuns deste país, é que parece que temos um sério infortúnio com o sector tutelado, a poder de "pedidos" e de "sugestões", sem ser devidamente obrigado a assumir, como deveria, qualquer papel regulador, papel este essencial mas, cirurgica e estrategicamente, removido da actual Lei Orgânica...
Penso sentir-me tal como diz um meu vizinho: ...pois é, (a)mandam cá para fora uns bitaites muito mal acoxambrados, e os outros que se amanhem....

21 janeiro, 2008

Digno de nota

A versão inicial da lei do RJIES (regime jurídico das instituições do ensino superior), introduzindo reformas radicais na governação universitária e, principalmente, com nova lógica de legitimação, determinava a extinção dos actuais mandatos reitorais com a aprovação dos novos estatutos. Os reitores, alguns dos quais em início de primeiro ou segundo mandato, conseguiram a revogação desta disposição e a sua permanência em funções até ao termo do mandato para que, antes da lei, foram eleitos.

Compreendo-os e não os critico, atendendo a que fizeram um grande esforço de candidatura, certamente com motivação e com reflexão sobre um programa de acção. A interrupção do seu mandato, psicologicamente, seria uma frustração. A sua reacção foi coisa no sentido humano.

Vem agora declarar António Rendas, reitor da Universidade Nova de Lisboa, que convocará eleições após a aprovação dos novos estatutos. É uma decisão que o digna. "Chapeau", meu caro amigo.

20 janeiro, 2008

Ainda por aqui ando

O meu oftalmologista deu-me uma folga de uns dias, que aproveito para os meus leitores não se esquecerem de mim. Hoje, contra as regras dos direitos de autoria, reproduzo um artigo notável do Público de hoje.

MORRER LIVRE

Marcos Sá

Pretendo contribuir com algumas reflexões para um tema controverso. Um tabu da nossa sociedade contemporânea onde quase sempre se verifica que a intolerância supera o bom senso. A questão é séria e fracturante. E quero, desde já, salvaguardar o respeito pelas crenças de cada um. Refiro-me concretamente à eutanásia. O termo eutanásia provém do grego e etimologicamente significa "morte tranquila". Como conceito, designa uma acção ou uma omissão que, pela sua natureza, procura a morte com o objectivo de eliminar a dor, estando habitualmente associada a cidadãos que sofrem de doenças terminais.

Um dos primeiros a defendê-la foi o médico e filósofo inglês Francis Bacon, que, em 1623, na sua obra Historia vitae et mortis, defendia ser "desejável que os médicos desenvolvessem a arte de ajudar os agonizantes a sair deste mundo com mais doçura e serenidade".

Quando se aborda a eutanásia, há que ter em conta a intencionalidade e o efeito da sua acção, que define o âmbito activo ou passivo da sua prática. Assim, a eutanásia é considerada activa quando se administra uma substância que provoca directamente a morte do doente, e passiva quando é efectuada através de uma omissão, isto é, quando um profissional de saúde deixa de prescrever um determinado medicamento que sabe resultar na morte do doente. O suicídio assistido é uma terceira forma de eutanásia e verifica-se quando um médico ou outra pessoa fornece ao doente a substância que lhe irá causar a morte, sem, no entanto, participar directamente na acção.

O código deontológico dos profissionais de saúde, em Portugal, estipula no n.º 2 do artigo 47º que "constituem falta deontológica grave quer a prática do aborto, quer a prática da eutanásia". Em 2007 foi aprovada em referendo a despenalização da interrupção voluntária da gravidez até às dez semanas e já se encontra em prática nos hospitais públicos do nosso país. Se esta situação foi possível pela mudança da lei, o mesmo poderá vir a suceder no futuro com a eventual despenalização da prática da eutanásia.

Devemos, por isso, reflectir sobre as seguintes questões: será que é moralmente aceitável prolongar a "vida", prolongando unicamente o sofrimento e a agonia? Será eticamente aceitável ocultar aos pacientes que a doença é terminal e que vão sofrer desumanamente? Será que é justo alguém que pratique a eutanásia a doentes terminais, a pedido destes, seja considerado um homicida?

Recentemente, ficou a saber-se que 39 por cento dos médicos oncologistas portugueses são a favor da legalização da eutanásia. Esta é uma das conclusões do estudo A boa morte: ética no fim da vida, realizado pelo coordenador da Unidade de Serviços Paliativos do IPO Porto, que inquiriu 143 médicos que lidam com doentes terminais. Tendo em conta que a actuação médica é movida por dois princípios morais: a preservação da vida e o alívio do sofrimento, fico com a absoluta convicção que os dados referidos anteriormente significam que a discussão deste tema deve ser aprofundado até à exaustão pela classe médica e pela bioética.

Aos políticos compete discutir se a eutanásia deverá ou não continuar a ser considerada um homicídio.

Para quê prolongar o sofrimento de um doente terminal, se a sua última vontade for ter liberdade para morrer? Nota final: passaram quase três anos da morte do meu pai. Para além da ligação genética, era o meu melhor amigo. Cinquenta e seis anos. Um ano a sofrer. Três meses a definhar. Não conseguia falar nem escrever. Questiono-me hoje o que teria feito (conseguisse ele falar ou escrever), se me pedisse para lhe conceder a última vontade, acabar com o seu sofrimento. A minha família assistiu à morte dele e acompanhou-o com muito amor e carinho. Mas a verdade é que só lhe vi novamente o sorriso, tranquilo, no fim do processo da morte. A vida é linda, e a morte faz parte dela. E a minha consciência não me permitiu adiar mais a partilha desta reflexão.

(Deputado do Grupo Parlamentar do PS )

Pfff!!!!....Ambição muito reduzida...

Um meu parente por afinidade trabalhou durante a vida inteira, para uma multinacional, na qual o salário de cada ano, era substancialmente afectado pelo cumprimento do traçado de um plano estratégico, com identificação muito precisa de metas, e objectivos bem definidos, que ele, via de regra, cumpria com empenho e capricho, enquanto pessoa e como líder da sua equipa.
Num determinado ano, esse meu parente superou várias vezes os objectivos que havia traçado e, por isso, aguardava com grande expectativa pessoal a sua recompensa financeira e, no entanto, não foi agraciado pelo chorudo prémio monetário que parecia garantido.
Ele ficou em choque e, para vos falar a verdade, na ocasião, também pensei que ele tinha sido muito injustiçado, mas quando lhe perguntei a causa do sucedido, a sua resposta foi:
A razão
foi que, através dos meus objectivos iniciais, tão largamente ultrapassados, só revelei "ausência de ambição".... Claro que, escusado será dizer, que a precisão do cumprimento de todos os seus projectos profissionais posteriores se tornou milimétrica, e .... porque não dizer? Valeu-lhe bastante a pena!
Desde aí, sempre que ocorre um "gap" entre os objectivos e as realizações em qualquer estratégia, me vem à memória a expressão, dolorosamente, desapontada desse meu familiar, e a minha constatação de que havia fundamento para a decisão penalizadora do CEO da empresa aonde ele prestou, "abnegadamente", e por tantos anos, os seus brilhantes serviços.
Esclareço que, desde aí, também passei a pensar "cobras e lagartos" sempre que alguém se distancia, exageradamente, entre os objectivos e as realizações, e considero imperdoáveis falhas desse teor, sobretudo, quando subscritas por aqueles políticos, que são...., como dizer?.... "políticos"?.

Contei-vos este episódio pessoal porque, anteontem, fomos oficialmente informados sobre a cerimónia de fundação do Laboratório Ibérico Internacional de Nanotecnologia (INL), que teve honras de estado, e até o direito a uma citação de Feynman.
Tal como a maioria, se não, a totalidade dos nacional-residentes, ficaría extasiada se o evento não revelasse uma lamentável deficiência de ambição política.

Pergunto eu, que sou das raríssimas pessoas portuguesas leigas nessa matéria:
"Porque carga de água é que haveríamos de de ter fundado um INL (Instituto Internacional Ibérico de Nanotecnologia) se temos ao nosso dispor uma gama infinita de escolha nas escalas de tamanho que, passando pela possibilidade real de ser ter fundado uma instituição dedicada à Peta-tecnologia, pode variar do ZERO ao Googol? (ver Tabela)
_____________

Termino, a condizer e persistindo neste tema sobre tamanhos de partículas, com uma citação de Paul Dirac - só me interessa o que pensa Deus, tudo o mais são detalhes.

18 janeiro, 2008

Morreu o Pacheco


O escritor mais dotado que me foi dado conhecer. Maldito, maldizente, libertino, libertário e uma escrita de fazer inveja aos vendedores de papel que se arvoram de escritores com obra impressa. O Pacheco não perdoava. Criticava com uma agudeza em muito superior aos bisturis a laser que agora se usam em cirurgia. Dos de renome, ninguém lhe escapou.

Ninguém lhe perdoou. E eu não lhe perdoo ter morrido. Luiz Pacheco teria muito mais para escrever.

Mas nem sempre passou à escrita pequenos episódios de uma imaginação delirante em que era fértil e protagonista. Não olhava para o umbigo e não escrevia só sobre si.

Reli com ternura alguns dos panfletos batidos à máquina, fotocopiados ou ainda mimeografados com que recheava envelopes e vendia, na feira do livro em banca própria de tabuleiro de chá, por vinte paus.

Uma rapariguinha de uns 14 anos, ainda na companhia dos pais, à distância, aparece para comprar um envelope. “Vintes! Autógrafo? Mais vintes.” A nota tinha sido cedida por um dos pais para a compra e miudita sem dinheiro na carteira disse que não tinha mais.

“E tens módulos? Sim. Então são dois!”

A dedicatória demorou quase uma hora de escrita.

Numa volta a Braga para refazer os passos que o tinham levado a escrever o seu célebre Libertino, viu-se sem dinheiro para a volta. Nada de espantar para quem sabia das vidas do Pacheco. Foi-se a um livreiro conhecido e pediu-lhe dinheiro para pagar a pensão e a volta. Embrenhado no seu negócio, e sabendo que o empréstimo nunca teria retorno, o livreiro fez-se rogado.

“Então empresta-me umas quantas bíblias escolares à consignação.”

Com uma enorme vontade de saber o que dali sairia, umas quantas cópias do livro sagrado mudaram de mão. Horas depois, pagando a primeira remessa, veio o pedido de mais.

“Luís, como é que consegues dinheiro a vender isso? Só custa 15 escudos!”

“Mas estas vendo-as a 50. São mais caras porque são autografadas pelo autor.”

Foto Luísa Ferreira/Público

13 janeiro, 2008

Até ao meu regresso

Por imposição oftalmológica, vou estar ausente da blogosfera durante algum tempo, talvez com vindas esporádicas. Espero que, ao regressar, os leitores me voltem a prestar alguma atenção.

12 janeiro, 2008

Os títulos académicos ainda valem alguma coisa…

O uso dos títulos académicos continua a exercer um poderoso fascínio sobre muitas pessoas. Recentemente, analisei os anúncios do Jornal de Notícias com algum cuidado. No capítulo do relax verifico que a oferta de alegadas jovens universitárias que oferecem os seus préstimos sexuais é bastante razoável. Poderemos duvidar das qualificações académicas. Afinal quem é que quer saber de títulos académicos quando se trata de comprar sexo? Para alguns clientes a universidade parece ser um poderoso afrodisíaco. A este propósito recomendo vivamente a leitura do capítulo Jovens acompanhantes: Puta de vida que me fez puta, de um livro de sociologia de José Machado Pais, Ganchos, Tachos e Biscates: Jovens, trabalho e futuro. Um livro brilhante escrito por um dos mais brilhantes sociólogos portugueses.

10 janeiro, 2008

Nota gastronómica (XLVIII)

Cozidos e guisados

O que têm em comum uma caldeirada e um ensopado? Várias coisas. São pratos feitos fora da cozinha, são cozinha de trabalho, sofrem aperfeiçoamentos de cozinha tradicional mais suculenta.

A caldeirada, na origem, é coisa simples feita na panela ao luar, na traineira, com peixe que se vai apanhando. Os pescadores pouco mais têm de levar do que azeite, sal, pimenta, batatas, cebola e tomate. A eito e deixar cozer, se o vento não apagar o lume. Tudo o resto já são enriquecimentos. É o que se passa com a caldeirada que faço, já a atirar para "bouillabaisse". Propositadamente, desta vez, não dou quantidades. Experimentem.

Caldeirada

Peixes variados, de preferência encorpados e duros, mas também sardinha ou, nos Açores, chicharro. Aquecer azeite virgem (mas não extra), cebola às meias-luas finas, alho esmagado, louro, Quando começar tudo a alourar, juntar tomate picado fino (vá lá, tolere-se, polpa de tomate), pimentão verde picado, louro e salsa. Depois de tudo bem alourado, colocar os peixes, os mais duros por baixo, temperar com sal, pimenta branca, salsa, malagueta, açaflor, um toque de vinho branco, uvas verdes, na época (se não, um gole de vinagre), e água a cobrir. Mais adiante, as batatas às rodelas e mais água quanto baste. No fim, servida sobre tostas de pão rústico.

E, o mar galgando a terra, passemos à campina alentejana e ao ensopado de borrego. Canonicamente, na sua versão genuinamente pastoril, é coisa simples, entre cozido e guisado. Os pastores tinham de simplificar a cozinha, borrego, batata, cebola, alho, pão, só o azeite a dar algum enriquecimento de refogado a um prato muito simples. Novamente, a minha versão, dada por uma boa cozinheira, adaptada por mim e depois verificando que é muito próxima de uma receita recolhida por M. Lourdes Modesto.

Ensopado de borrego

Passar a carne por farinha e alourar muito bem em banha. Retirar e refogar na mesma banha cebola picada, alho pisado, louro. Quando alourado, juntar massa de pimentão, dar mais umas voltas e misturar a carne. Água a cobrir, sal, malagueta, pimenta preta, cravinho, salsa. No fim, claro, as batatas e o servir sobre o pão caseiro um pouco torrado. Cuidado: nem ponta de coentros, que há por aí muita gente que julga que cozinha alentejana leva obrigatoriamente coentros.

08 janeiro, 2008

A ciência e tecnologia vistas de um outro angulo

Hoje, é só para divulgar, aos meus caros e raros leitores, duas publicações interessantes, que achei no sítio do GPEARI (ex OCES):

1ª - Dotações Orçamentais para C&T e I&D - 2008

2ª - "recursos humanos e financeiros afectos a actividades de investigação científica e desenvolvimento tecnológico (I&D) em Portugal para os quatro sectores de execução: Empresas, Estado, Ensino Superior e Instituições Privadas sem Fins Lucrativos (IPSFL)":
Sumários Estatísticos IPCTN.05 Inquérito ao Potencial Científico e Tecnológico Nacional 2005 [edição revista] ou aqui (ficheiros excel, bastante pormenorizados)

Apenas um levíssimo comentário - o financiamento, previsto para o subsistema politécnico público, ascende a nada mais nada menos que, vejam lá, 8% do total - magnanimidade!

Tecnologia portuguesa

Aos poucos, vou relendo recortes de jornais que me mereceriam notas, agora atrasadas. Mas, às vezes, requentar a comida não lhe tira o gosto. Há já algumas semanas, uma missão do Atlantis levou para a ISS um módulo europeu, o laboratório de investigação Columbus.

Claro que Portugal, que contribui com muito dinheiro para a Associação Espacial Europeia (ESA), não podia deixar de participar. O Columbus inclui coisa decisiva portuguesa, um termómetro. Claro que um termómetro especial. Mereceu notícia destacada nos jornais, mas não consegui perceber uma coisa importante: qual é o valor percentual desse termómetro no total do investimento feito no Columbus?

E qual foi também o valor (económico e/ou científico) dos instrumentos de medida com que se tem contribuído para o CERN, comparado com o total dessas mega-experiências de aceleração de partículas?

Já agora, o que é feito do PoSat-1? O que se obteve dele, em conhecimento científico ou em resultados de interesse económico? E haverá mais alguma ilusão de um PoSat-2? Deve ser difícil, agora que acabou a UnI.

Com tudo isto, apetece-me repetir o que era meu hábito como conclusão de apontamentos deste género: o rei vai nu!

07 janeiro, 2008

Sócrates é fascista?

António Barreto é um colunista muito lido, aureolado por uma reputação de respeitabilidade intelectual, com pergaminhos académicos. Nem sempre concordo com ele. Se calhar, até só muito raramente, mas devo reconhecer que o seu artigo de ontem no Público merece referência, concorde-se ou não. Conclui Barreto:
"Não sei se Sócrates é fascista. Não me parece, mas, sinceramente, não sei. De qualquer modo, o importante não está aí. O que ele não suporta é a independência dos outros, das pessoas, das organizações, das empresas ou das instituições. Não tolera ser contrariado, nem admite que se pense de modo diferente daquele que organizou com as suas poderosas agências de intoxicação a que chama de comunicação. No seu ideal de vida, todos seriam submetidos ao Regime Disciplinar da Função Pública, revisto e reforçado pelo seu Governo. O primeiro-ministro José Sócrates é a mais séria ameaça contra a liberdade, contra a autonomia das iniciativas privadas e contra a independência pessoal que Portugal conheceu nas últimas três décadas.
Temos de reconhecer: tão inquietante quanto esta tendência insaciável para o despotismo e a concentração de poder é a falta de reacção dos cidadãos. A passividade de tanta gente. Será anestesia? Resignação? Acordo? Só se for medo ..."

Sinceramente, Barreto não sabe? Parece-me boutade evidente, mas é preciso ter cuidado, principalmente quando é o próprio Barreto que começa assim o seu artigo:

"Em consequência da revolução de 1974, criou raízes entre nós a ideia de que qualquer forma de autoridade era fascista. Nem mais, nem menos. Um professor na escola exigia silêncio e cumprimento dos deveres? Fascista! Um engenheiro dava instruções precisas aos trabalhadores no estaleiro? Fascista! Um médico determinava procedimentos específicos no bloco operatório? Fascista! Até os pais que exerciam as suas funções educativas em casa eram tratados de fascistas."

Ao contrário de Barreto, "sinceramente sei" que Sócrates não é fascista. Tem tiques óbvios de autoritarismo e de arrogância, mais facilmente perdoáveis a quem tivesse outra superioridade intelectual. Tem dificuldade em dialogar, é indiscutível. Porque posso desculpar? Porque creio que ele é motivado com genuinidade por um projecto de reforma. Parafraseando Barreto, "parece-me, mas sinceramente não sei". Se é motivado, não lançarei eu a primeira pedra. Em toda a minha vida o espírito de missão me tem tolhido muitas vezes a capacidade - a necessidade - de diálogo. E, já agora, o que foi o espírito de diálogo de Barreto a quando da sua lei da "reforma" agrária?

04 janeiro, 2008

Tem coisas que é melhor serem contadas

1, 2, 3, 4, 5, 6,...#$&~***/$»»##!....enganei-me outra vez!

Desde meados do mês passado, e até finais de Abril, andarei embrulhada em contagens...
Para quê? Perguntam-me, intrigados, os meus caros e raros leitores.
E eu sei?
Ando, a fazer uns Relatórios para aqui, uns "pauerpointes" lindos de morrer para ali, umas compilações bibliográficas para acolá...
Hoje calha-me a preparação de uma auditoria para isto, amanhã, é um diagnóstico para aquilo, depois de amanhã (na verdade, a 24 de Janeiro) são uns inspectores dos internacionais - mais exigentes e atarantados que os "GOE" da ASAE - que dizem "really, need" de saber coisas que, aliás, eu gostaria ainda mais de saber, mas que ...etc., etc.... os meus caros e raros leitores sabem bem como é...

Dito de outra maneira, acreditem-me, ando atarefadíssima com procedimentos e resultados, que se assemelham muito aos do "meu prezado amigo" Zé Mariano - esfalfo-me mesmo até à exaustão, à toa e para nada! Começo a percebê-lo?

E, é assim que se vão passando e publicando informações que me interessam e fazem falta, e eu sem poder dar fé. Para o caso de lhes terem também passado ao lado, deixo-lhes os links:

  1. OECD - Education at a Glance 2007
  2. OECD Science, Technology and Industry Scoreboard 2007
  3. OECD in Figures (2006-2007)

Realmente, meus amigos, tem coisas que é melhor serem (bem) contadas do que vistas, é o caso de bênçãos, da transumância de ovelhas na hora do "rush", de inventários em geral e das nossas eventuais vivências na Educação, Ciência Tecnologia e Ensino Superior.

Agora, lá terei que regressar de novo, por mais uns diaaaaaaaaas, à clandestinidade das trincheiras, para fazer as contagens que me mandam, porque é assim mesmo a História do povo: manda quem pode e obedece quem tem juízo...

Prova de vida

Começo por dizer que é coisa horrorosa que tenho de fazer anualmente, junto do meu pagador de reforma, provar que estou vivo. Então não sabem, sou assim tão incógnito? Agora são os partidos. O que seria da credibilidade pública de um PS, de um PSD, de um PCP, de um CDS, se não provassem preto no branco que ainda vivem?

Claro que estou a brincar, o problema coloca-se é em relação aos fantoches da democracia partidária. Mas desta forma, dando ao Tribunal Constitucional os dados de pelo menos 5000 inscritos? Duvido. Afinal, para quê anular o registo de um ou outro partido fantasma? Certo, mas há formas mais eficazes de acabar com essa "fraude". Pergunta elementar: o que lucra um "partido" com estar registado?

Teoricamente, lucra com financiamento público da sua presença parlamentar e muito bem; talvez, não estou certo, com algum financiamento de campanhas eleitorais. A solução é muito simples, só se subsidia acima de um certo número de votos.

Lucra com tempo de antena. Também simples, embora com o risco de perpetuar situações adquiridas. Os partidos com representação parlamentar gozam do regime actual. Os restantes têm direito a tempo de antena proporcional aos votos que obtiveram nas últimas eleições. Idem para a obrigatoriedade dos órgãos de comunicação social de darem igual destaque a todas as candidaturas. Claro que isto põe problemas no caso de um partido novo.

Outra hipótese: as candidaturas apresentadas por partidos, em cada círculo, têm de ser subscritas por um número mínimo de apoiantes, claro que razoavelmente baixo. Mais ainda. na apresentação de contas, fixação de um mínimo de "cash flow" demonstrativo de também um mínimo de actividade.

Creio que nenhuma destas hipóteses vai contra o que tem sido invocado, a defesa da privacidade dos membros dos partidos. Mesmo isto tem que se lhe diga porque, para a sua criação tiveram de apresentar as tais 5000 assinaturas, públicas. Mais, ninguém precisou de provar que nenhuma dessas assinaturas era de um membro de outro partido. Não é verdade, Zita Seabra e Maria Santos?

03 janeiro, 2008

Neo-contrição

Francis Fukuyama, um dos intelectuais americanos mais mediáticos que ajudou a erguer a ideologia neo-conservadora da Administração Bush que esteve na base da invasão do Iraque pelos Estados Unidos, assinou ontem no Público uma crónica sugestivamente intitulada A Autodestruidora hegemonia americana. É um acto de contrição por parte de Fukuyama que se junta a outros que assinou nos últimos tempos.

Ao lê-lo perguntei a mim próprio o que é feito de todos os que em Portugal apoiaram a invasão do Iraque pelas tropas americanas: Vasco Rato, Paulo Tunhas, Fernando Gil e Pacheco Pereira, entre outros. Parece que Pacheco Pereira, num comentário recente que lhe ouvi, criticou a Administração Bush pelo facto de ter baseado a invasão do Iraque na pretensa existência de armas de destruição de massas quando o pretexto deveria ter sido um facto puramente político: o Iraque constituía um factor de destabilização do Médio Oriente que se tornava necessário eliminar.

Esta argumentação é a racionalização do absurdo. E veio-me à memória o célebre livro de Raymond Aron, O Ópio dos Intelectuais, escrito em 1957, onde se acusava a elite intelectual marxista de então de desviar o olhar dos crimes existentes nos países socialistas. O ópio de Pacheco Pereira agora é outro. Mas não deixa de ser menos abominável.

Nota gastronómica (XLVII)

Costeletas de pato

Ainda em semi-férias, vou dando prioridade às notas gastronómicas. Fiz ontem uma receita de pato, inventada um pouco à pressa, mas que resultou bem. Tinha comprado, no único supermercado que vale a pena (não é preciso dizer qual) umas costeletas de pato. É coisa que não conhecia. O peito é cortado às fatias de cerca de 1 cm de espessura ao longo da coluna vertebral, portanto perpendicularmente ao que normalmente são os peitos de pato ou supremos. Ao contrário do corte da carne de vaca, em que o sentido faz toda a diferença, não creio que aqui seja importante. O que pode ser digno de nota é que este corte deixa cada "costeleta" com uma boa camada da gordura superficial, que se derrete completamente na fritura.

Pensei fazê-las com algum toque oriental, a lembrar um agridoce mais agri que doce, mas o júnior não estava muito para aí virado e pediu-me uma coisa mais "seca". Saíram assim.

Costeletas de pato com molho de pimenta verde em nata azeda
1 kg de costeletas de pato, 1 dl de vinho moscatel, 1 cálice de aguardente, 3 c. sopa de manteiga, 2 dl de nata, 1 iogurte natural, 3 dentes de alho, 1 folha de louro, 1 c. sobremesa de boa mostarda de Dijon (não uso outra!), sal, 15 grãos de pimenta verde.

Esfregar bem as costeletas com o vinho e deixar umas horas no frigorífico. Escorrê-las muito bem, colocá-las numa frigideira larga, sem se sobreporem, regar com a aguardente e flamejar. Acrescentar a manteiga e fritar, de um lado e de outro, rapidamente, temperando com sal. Remover as costeletas e alourar o alho laminado, juntando a folha de louro. Rejeitar tudo isto e parte da gordura, sem descolar o fundo. Desglaciar com o vinho e juntar a nata, o iogurte e a pimenta. Deixar ferver, mexendo bem, a lume médio-baixo, durante alguns minutos, até o molho estar encorpado. Fora do lume, misturar bem a mostarda. Juntar as costeletas, a aquecer. Servir apenas com batatas fritas.

02 janeiro, 2008

Estradas de Portugal, EP

Lembrei-me agora de uma notícia num jornal de 2 de Janeiro de já há uns bons trinta anos. Já então não se publicava o jornal no dia 1 e, portanto, vinham notícias atrasadas do dia 31. Uma referia-se a um caso insólito, um enorme susto de um maquinista da linha do Estoril que encontrou pela frente um automóvel, perto de Caxias. Era de um meu conterrâneo, amigo de família, TC, boémio inveterado e então em noite de passagem de ano...

Apurou-se que o TC tinha entrado na linha férrea na passagem de nível que então existia em Belém. De Belém a Caxias, imaginam? O que não me esquece é de o TC dizer "eu bem achei que estas estradas estão todas uma grande merda...".