Sobre o corporativismo médico, eu posso ser suspeito, faço parte do clube. Por isto, valorizo uma opinião externa, a de Vital Moreira, ontem no Público.
Quanto ao real défice de médicos, estamos a pagar há vários anos a malvada contingentação das vagas nos cursos de Medicina nos anos 80 e 90, que ministros e universidades irresponsavelmente conceberam e executaram. Apesar da correcção iniciada há uma década, com a criação de duas novas faculdades e a progressiva ampliação do numerus clausus, que vem até hoje, as vagas continuam a ser comprovadamente insuficientes para as futuras necessidades do sector, tanto mais que se mantêm longos períodos de formação pós-graduação. Neste ponto, portanto, só resta continuar a apostar na importação de médicos - o que desde há muito sucede com os médicos espanhóis -, um bem que todavia não abunda em muitos lados.
Por último, não há nenhuma razão para facilitar a saída de médicos para o sector privado. Cabendo ao SNS a responsabilidade da formação médica, é perfeitamente justificável não somente a exclusividade com horário prolongado durante o internato - até para não obnubilar, logo no início da carreira, a necessária cultura de separação de interesses entre o público e o privado (mesmo que à custa de algum aumento de remuneração) -, mas também a imposição de um período razoável de vinculação ao sector público após a conclusão do internato, como compensação da formação adquirida e dos respectivos encargos. Não é aceitável que o SNS forneça gratuitamente médicos especialistas ao sector privado, sem nenhuma contrapartida dos beneficiários, ou seja, os médicos e as empresas privadas.
Não o tinha escrito ainda, mas concordo inteiramente com esta proposta de Vital Moreira de obrigar os médicos a uma compensação ao SNS pela formação nele prestada. Mais adiante, escreve outra coisa com que concordo inteiramente, até como autor de uma proposta de um curso de medicina privado.
Não se compreende a espécie de tabu, ou simples preconceito, que existe entre nós contra a admissão de cursos privados de Medicina, caso único no panorama português do ensino superior. É certo que há alguns anos uma comissão ad hoc reprovou todas as candidaturas então existentes, por alegada falta de qualidade. No entanto, independentemente de saber se não foi utilizada uma grelha demasiado exigente, que teria chumbado qualquer outro curso privado em qualquer área, não é de excluir a possibilidade de agora poder haver candidaturas mais consistentes.
Não há nenhuma razão para pensar que não existe uma única instituição privada em condições de criar e sustentar um curso decente de Medicina, sem perder, antes pelo contrário, na comparação com os cursos médicos que muitos jovens portugueses hoje pagam no estrangeiro, desde a Espanha e a República Checa até ultimamente à República Dominicana, como foi recentemente noticiado!
Mais, gostaria que a comissão que está a analisar tão “rigorosamente” as novas propostas de cursos de medicina começasse por analisar os actuais.
1 comentário:
este sim é um corporativismo a sério
e também acredito que se tivessem avaliado os cursos actualmente em funcionamento pela tal grelha, poucs escapariam
o que quer dizer que o júri devia ter ponderado nessa grelha a qualidade dos cursos já em funcionamento, pelo que resta saber porque razão não o fez
por outro lado sendo este um problema politico, é bom que se reconheça que ninguém em tempo algum ousou afrontar a classe médica
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