31 dezembro, 2007
Preciso de testemunhas!
Parafraseando alguém, que não sei quem seja, desejo a todos os meus caros e raros leitores que os vossos momentos menos felizes em 2008 durem ainda menos que as minhas pouquíssimas e óptimas resoluções de todos os anos "novos" (agora já bem velhotes):
1 - Deixar de fumar (pela 48ª vez);
2 - Substituir o meu "hobby" congénito favorito - a desorganização - por qualquer outra coisa menos terminal.
Até para o ano!
30 dezembro, 2007
Nota gastronómica (XLVI)
Não sei bem se há alguma tradição bem estabelecida de pratos de jantar de Ano Novo. Na minha terra creio que não, embora, na reunião patriarcal em casa do meu avô fosse frequente a galinha. Porque não experimentam?
O que se segue é banalidade, não é nada que se compare com o meu capão recheado de dia de Natal, receita de família. Mas como quem não tem cão caça com gato, talvez esta nota, escrita já há semanas mas esquecida de publicação, possa ter alguma utilidade para o jantar de Ano Novo. Com um pequeno esforço de adaptação de doses e tempos, dá para um peru. Como sou preguiçoso, mantenho o que fiz e escrevi, receita de galinha. O leitor que adapte.
Ainda uma nota, antes de passar ao que interessa. Se vou muito a restaurantes de grande cozinha de autor, sinto-me às vezes, eu que sou melómano, a pensar que estou a ouvir demais os contemporâneos e a esquecer os clássicos. Nestas alturas, ponho a tocar Mozart e caio em mim. Também na cozinha. Ultimamente, tenho andado por experiências modernistas, mas há dias apeteceu-me isto, uma galinha simplesmente recheada e assada à clássica. Passou de moda, mas deu-me a delícia de um grande jantar. Curiosamente, também ao meu júnior de 21 anos, que só se queixou de que o recheio era pouco.
1 galinha ou frango do campo, com 1,8-2 Kg e com miúdos. 1 cebola, 4 cravinhos, 1 raminho de salsa, sal, 10 grãos de pimenta preta, água de nascente q. b.
200 g de pão rústico, 3 c. sopa de manteiga, 1 cebola pequena, 200 g de cogumelos, de preferência boletos, 2 ovos, 150 g de pasta de fígado de ganso ou de pato, simples ou, quando muito, temperada com vinho do Porto, 75 g de miolo de nozes.
Molho. 2 c. sopa de manteiga, 2 c. sopa de farinha, 1 cálice de vinho do Porto, 1/2 limão, 1 c. café de folhas de tomilho (tenho-as frescas no jardim, mas não há mal em usá-las comerciais).
Fazer canja com os miúdos, a cebola picada com os cravinhos, a salsa, sal e pimenta preta. Coar e reservar o fígado.
Desfazer o pão em pedaços pequenos e embeber em canja, só a amolecer. Ao fim de meia hora, alourar na manteiga a cebola picada muito fino, juntar 80 g de cogumelos laminados grosso e dar umas voltas. Acrescentar o pão, escorrido e os ovos batidos e mexer muito bem, a lume forte, até secar e começar a fazer crosta no fundo do tacho. Corrigir o tempero de sal e pimenta preta. Fora do lume, misturar muito bem com a pasta de fígado e com o miolo de noz moído.
Esfregar a galinha com sal e pimenta preta, rechear com a pasta de pão e tapar com folha de alumínio o que ficar à vista de recheio (melhor, coser com linha de cozinha, a tapar). Colocar numa assadeira, untada, cobrir com lascas de manteiga, regar com um pouco de vinho branco e assar em forno a 200º, pré-aquecido, regando frequentemente com o molho e um pouco de canja.
Alourar bem em manteiga, com um fio de sumo de limão, o resto dos cogumelos, inteiros. Temperar ligeiramente com sal e pimenta.
Para o molho, fundir a manteiga e alourar a farinha, mexendo sempre. Fora do lume, juntar o fígado esmagado e misturar muito bem. Voltar a lume médio e acrescentar aos poucos, a incorporar bem, o vinho do Porto, o sumo de limão, 2 dl de canja, o tomilho. Rectificar a espessura e o tempero.
Para servir, remover o recheio, sem o desfazer, e cortar às fatias. Colocar a galinha numa travessa guarnecida com as fatias de recheio e com os cogumelos salteados. Numa molheira, à parte, o molho.
Nota - se quiserem variar, experimentem, por exemplo, substituir o miolo de noz por azeitonas descaroçadas cortadas às rodelas, ou o tomilho por uma mistura de estragão, cerefólio e segurelha, se conseguirem arranjar.29 dezembro, 2007
Notas soltas
2. Tem-se defendido a tese Portela+1, mas em que a Portela seria o aeroporto internacional, principal e o +1, eventualmente Alcochete, o aeroporto para os voos "low cost". Por experiência familiar, conheço um caso equivalente, o de Estocolmo, em que o aeroporto "low cost" é mais distante da cidade do que o internacional de Arlanda. No entanto, embora não percebendo nada do assunto, pergunto-me, instintivamente, se não faria mais sentido o contrário. Queremos atrair turistas, mas turista para Portugal, reconheçamos, é em boa parte turista que quer "low cost", em tudo, incluindo na ligação entre o aeroporto e a cidade. Não faria mais sentido que o "low cost" fosse a Portela, limitada, com eventual aproveitamento ambiental, lúdico ou outro de estruturas e espaços entretanto tornados desnecessários? O mesmo para os voos domésticos, embora com garantia de boas ligações para os passageiros em trânsito no novo aeroporto.
3. No seu artigo semanal do Público, José Pacheco Pereira (JPP) discorre sobre "A cultura de blogue nacional". Claro que subcultura, irreflectida, sem regras de rigor intelectual, apressada, com tudo o que Eça denunciou em relação ao jornalismo português, a começar pelo Palma Cavalão. "Os blogues são apenas mais uma câmara de ressonância da pobreza da nossa vida cívica". Mas JPP não tem um blogue? Ou será que ele é aquele recruta que deliciava a mãezinha, "vejam, tanta gente a marchar e o meu filho é o único com o passo certo".? Espantoso é que critique a blogosfera por ser avessa à crítica. O Abrupto aceita comentários?
27 dezembro, 2007
Canja de galinha para o farnel do pescador
PS - Imaginem os meus caros e raros leitores só a bela ideia de nos podermos ver livres de trambolhos regimentais como os corre-corre para gastar as verbas de final de ano, as especificações paralisantes do Decreto-Lei 197 de 1999, e bloqueadoras de Códigos de Procedimentos Administrativos, e passarmos a "Códigos Fiscais", de dispensarmos assinaturas - discutidas à consumos de paciência de confissões pseudo-políticas da cadeia financeira presidencial e/ou reitoral, me faz rejubilar.
Nota gastronómica (XLV)
Nesta semana, à falta de motivos para comentários políticos e com os universitários em férias, é tempo de comezainas. No jantar de Natal, começámos com canapés variados, ainda antes da mesa. Foram de pão rústico tostado com compota de escabeche e mexilhões; de pão branco ligeiramente tostado, barrado com geleia de carne e Porto e com fatias de fígado de pato salteado, depois de marinado em leite e ervas; de pão rústico barrado com pasta de brie, nozes moídas, nata azeda, mostarda e um toque de cominho, coberto com paio alentejano; de broa tostada barrada com tapenade e coberta com "chèvre"; e de broa barrada com manteiga trabalhada com molho de vilão açoriano (vem no meu livro), cobertas com uma bolinha de atum simples, esmagado. Como a compota fez sensação, aqui fica a receita.
Picar grado três cebolas grandes e deixar durante dois dias, no frigorífico, com uma cenoura às rodelas finas, 2 dentes de alho esmagados, uma folha de louro, 1,5 c. sopa de vinagre, 1 raminho de salsa, sal, pimenta, alguns grãos de pimenta da Jamaica ou de cravinho, a gosto, um toque de açaflor ou de açafrão. Vinho branco a cobrir bem.
Aproveitar só a cebola e coar e reservar todo o líquido. Fazer calda com 80 g de açúcar e o líquido coado. Juntar a cebola e levar a ponto de compota, acrescentando água se necessário. Quase no fim, bater bem com 1 c. chá de manteiga, corrigir o tempero e a consistência e moer.
21 dezembro, 2007
É para outro
Enquanto vou fazer umas compritas da ocasião à última hora, aqui ao lado, os meus caros e raros leitores podem acabar de pôr a mesa?
Obrigada.
Cuidado, não trinquem a maçã, enquanto não lerem COM ATENÇÃO, o Material Safety Data Sheet da dita, além disso, ela está, exclusivamente, destinada a "homenagear um meu convidado muito especial", ....
(Deixaram-me sozinha...
E ainda dizem que eu é que sou uma bruxa má...)
20 dezembro, 2007
Boas Festas
O meu impagável amigo Pedro Aniceto publicou agora o resultado do seu concurso "o pior postal de 2007". Isto porque não foi a tempo o postal em epígrafe. Tem que se lhe diga. A ideia é surrealista, divertiu-me muito, mas um script errado enviou-o para gente respeitável e circunspecta, que me manifestou desagrado por eu ter enviado tal porcaria. Espero que os leitores destas notas tenham sentido de humor. Voas vestas, hips...
Carnaval?
19 dezembro, 2007
Soturnidade, melancolia, depressão de ilhéu
Nas nossas ruas, ao anoitecer,
Há tal soturnidade, há tal melancolia,
Que as sombras, o bulício, o Tejo, a maresia
Despertam-me um desejo absurdo de sofrer.
O céu parece baixo e de neblina,
O gás extravasado enjoa-me, perturba-me;
E os edifícios, com as chaminés, e a turba
Toldam-se duma cor monótona e londrina.
Batem os carros de aluguer, ao fundo,
Levando à via-férrea os que se vão. Felizes!
Ocorrem-me em revista, exposições, países:
Madrid, Paris, Berlim, Sampetersburgo, o mundo!
Semelham-se a gaiolas, com viveiros,
As edificações somente emadeiradas:
Como morcegos, ao cair das badaladas,
Saltam de viga em viga, os mestres carpinteiros.
Voltam os calafates, aos magotes,
De jaquetão ao ombro, enfarruscados, secos,
Embrenho-me a cismar, por boqueirões, por becos,
Ou erro pelos cais a que se atracam botes.
E evoco, então, as crónicas navais:
Mouros, baixéis, heróis, tudo ressuscitado
Luta Camões no Sul, salvando um livro a nado!
Singram soberbas naus que eu não verei jamais!
E o fim da tarde inspira-me; e incomoda!
De um couraçado inglês vogam os escaleres;
E em terra num tinido de louças e talheres
Flamejam, ao jantar, alguns hotéis da moda.
Num trem de praça arengam dois dentistas;
Um trôpego arlequim braceja numas andas;
Os querubins do lar flutuam nas varandas;
Às portas, em cabelo, enfadam-se os lojistas!
Vazam-se os arsenais e as oficinas;
Reluz, viscoso, o rio, apressam-se as obreiras;
E num cardume negro, hercúleas, galhofeiras,
Correndo com firmeza, assomam as varinas.
Vêm sacudindo as ancas opulentas!
Seus troncos varonis recordam-me pilastras;
E algumas, à cabeça, embalam nas canastras
Os filhos que depois naufragam nas tormentas.
Descalças! Nas descargas de carvão,
Desde manhã à noite, a bordo das fragatas;
E apinham-se num bairro aonde miam gatas,
E o peixe podre gera os focos de infecção!
P. S. E um ilhéu sente-se no cinzento de mar e céu e sofre.
Europa?
Mas está errado. Ainda há pouco tempo, para se apurar para um campeonato europeu de futebol, a selecção portuguesa teve de jogar no Azerbeijão e, pasme-se, até no Casaquistão. Agora, leio que a Organização para a Segurança e Cooperação Europeias (OSCE) supervisou as eleições (europeias) no Quirguistão. Um dia destes, a Mongólia está a pedir a entrada na UE.
Nota - A propósito, sabiam que as ilhas açorianas das Flores e do Corvo são americanas, não europeias como a minha ilha micaelense?
18 dezembro, 2007
Universidades fundações
O artº 177º da lei nº 72/2007 (RJIES) estipula, de facto, que "no prazo de três meses sobre a entrada em vigor da presente lei, a assembleia a que se refere o n.º 2 do artigo 172.º pode, por deliberação tomada por maioria absoluta dos seus membros, solicitar, nos termos previstos no artigo 129.º, a passagem da universidade ao regime fundacional." A assembleia é a que tem estado a ser eleita para elaborar os estatutos, de acordo com a nova lei. Em muitos casos, ainda não está concluído o processo da sua constituição (nomeadamente a escolha dos membros externos) e é evidentemente inviável que ela requeira a passagem a fundação.
Como a lei foi publicada em 10 de Setembro e entrou em vigor um mês depois, o prazo referido pelo jornal está correcto. No entanto, isto é meia verdade. Nada impede que, aprovados os novos estatutos segundo o regime geral e constituído o conselho geral, este venha a propor em qualquer momento, mais serena e ponderadamente, uma eventual passagem ao regime de fundação, como se diz no artº 129º: "Mediante proposta fundamentada do reitor, aprovada pelo conselho geral, por maioria absoluta dos seus membros, as universidades e institutos universitários públicos podem requerer ao Governo a sua transformação em fundações públicas com regime de direito privado."
17 dezembro, 2007
Transgénicos
Direito e Direito
16 dezembro, 2007
Ainda outra efeméride
15 dezembro, 2007
Só é mesmo difícil dizermos que não, a nós mesmos!
"O Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, José Mariano Gago, segue com preocupação estes casos, tendo sido já contactados os responsáveis das instituições envolvidas para o cabal esclarecimento da situação. Sem prejuízo do necessário apuramento de responsabilidades civil e criminais, recorda-se que o novo Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES) já em vigor determina que constitui igualmente infracção disciplinar «a prática de actos de violência ou coacção física ou psicológica sobre outros estudantes, designadamente no quadro das 'praxes académicas'»".
Considero deficitária a percepção que essas declarações denunciam, quando indirectamente expressam uma expectativa de que as causas remotas desses, efectivamente, gravíssimos acidentes sejam controladas de raiz se as identificarmos como infracções disciplinares, até precavida e cuidadosamente, previstas e contempladas no RJIES.
Perguntaria, hoje, tal como já o fiz, em 5 de Julho se ao invés de sequer sugerirmos processos disciplinares não deveríamos tentar mobilizar, induzir e motivar todas instituições de educação superior a adoptarem Códigos de Boas Práticas, nas suas múltiplas dimensões e facetas.
Questionam-se alguns dos meus caros e raros leitores: e aí? grande coisa... qual é a diferença?
Na verdade, para mim, a diferença é abismal, porque a construção de raiz de Códigos de Boas Práticas obriga à participação efectiva daqueles a quem se destina e, em consequência, a uma auto-responsabilização, pelas opções tomadas, e sobre o que se pode e deve ou não fazer em circunstancias específicas devidamente ponderadas - trata-se de uma produção de documentos educativos (obrigam a pensar) redigidos com base em posturas reflexivas e integradas, e não de simples instrumentos mais ou menos legais, soltos e repressivos, vindos sabe-se lá porque motivos da cabeça de um iluminado e incógnito quem.
Pelos vistos, até hoje, ninguém ou muito poucos deram a devida atenção à redacção do RJIES, em geral e, muito particularmente, deram ainda menos crédito a essa passagem específica sobre a infracção disciplinar.
Entretanto, contentemos-nos com uns "responsos" esporádicos, agitados lá do alto, sobre uns hipotéticos responsáveis institucionais, exibindo uma certa tranquilidade de espírito que resulta da existência de umas quantas regras disciplinares avulsas escritas aqui ou ali... Por outro lado, indirectamente, expressando a preferência por manter jovens pessoas, sob receios repressivos, mas sem nenhum respeito, por umas quantas regras disciplinares, ao invés de se empenharem e auto obrigarem a prestar muita atenção aos seus actos, e à consideração de consequências sobre as suas ideias, opiniões, decisões e acções, que muitas das vezes imporiam que disséssemos que não a nós mesmos, especialmente, quando nos é difícil.
Dizem-me, que esta minha manifestação é demasiado serôdia - têm razão, estava até para não dizer nada sobre o assunto, mas ultimamente todos os dias, ou quase, venho assistindo à prática de actos de violência ou coacção (....) psicológica sobre outros e não têm a assinatura de jovens ou se podem explicar, candidamente, por excessos de praxes académicas.
Outro centenário
Hoje, felizmente de pessoa ainda bem viva, de alguém com nome indelével na história da arquitectura, Óscar Niemeyer. Como homenagem, podia ter publicado uma fotografia do Palácio da Alvorada, do Congresso com as suas cúpulas em inversão, da catedral de Brasília, do aeroporto Santos Dumont, do museu de Niterói, tanto mais. Preferi lembrar que há uma obra do mestre em Portugal: o Hotel Casino, no Funchal.
14 dezembro, 2007
Centenário
Beatriz Costa nasceu em 14 de Dezembro de 1907. Aqui fica a minha homenagem, recordando uma das mais célebres cenas de um cinema português que, não sendo de génio intelectual, fez as delícias de muita gente, até, em segunda geração, de gente da minha idade.
13 dezembro, 2007
Nota gastronómica (XLIV)
Ofereceram-me uma grande lebre, ainda com pelo e a ferida visível do tiro. Nunca tinha cozinhado lebre, só estava familiarizado com cozinhar o coelho bravo da minha terra, habitualmente frito e com um molho de desglaciar a fritura. Também, excelente, de escabeche, como vem no meu livro. Com o meu irmão DVC, meu alter ego gastronómico, desafiámo-nos a uma lebre com feijão, mas foi aventura difícil.
Começa logo por se distinguir feijoada de lebre e lebre com feijão. Não são exactamente a mesma coisa. No segundo caso, o que me interessava, o feijão é quase só acompanhamento final, sem dar demasiado sabor ao prato, ao contrário de uma feijoada tradicional (e por isto é feijão branco).
Depois, uma boa compilação de receitas mostrou-me diferenças assinaláveis. E não eram só receitas de net, eram de um famoso restaurante alentejano, de um gastrónomo reputado, de recolhas de regiões turísticas e até de uma amiga, boa cozinheira e mulher de um caçador alentejano. Verifiquei, assim, que não há uma receita "canónica". Portanto, mais uma para a colecção, resolvi fazer uma rapsódia do que achei melhor. Não digo se ficou a melhor que já comi, mas garanto que, para meu gosto e do DVC, ficou muito recomendável (para ser modesto). Como de costume, podem sacar a receita do meu "site".
Nota - Quase por automatismo, ainda pensei num toque de tempero com alecrim e carqueja. Asneira, isto é o que uso para disfarçar coelho manso, bicho horroroso, que só vai também com grande carga de cozedura com a vinha de alhos. Para lebre não, coisas a mais é só estragar o seu magnífico sabor de caça.
Male pride!
Errata, 15:27 - Chamaram-me a atenção: "Quem disse que parecia “uma lésbica velha” foi o novo James Bond – Daniel Craig". É verdade, culpa minha de ter escrito de cor, sem o jornal ao pé. É que vinha tudo na mesma notícia e misturei. Peço desculpa.
12 dezembro, 2007
A orthographia
A língua é a minha pátria, sem dúvida. Mas a língua é estrutura do pensamento, simbologia, sintaxe, beleza musical, instrumento de comunicação, vocabulário misturado de origens diversamente ricas. O que é que isto tem a ver com o artifício da ortografia? A língua portuguesa perdeu alguma coisa com a extinção de milhares de pharmacias por todo este país? Depois de 1911, deixou de se estudar physica ou chimica?
As reformas ortográficas, tanto quanto percebo, tendem a adequar a ortografia à fonética. Creio que há aí grande dificuldade, porque a ortografia é uniforme e a fonética é extremamente variada. Qual é a fonética que domina o acordo? A de Coimbra? Porque é que há-de se mais importante do que a dificuldade de um micaelense, como eu, em escrever cabra quando se diz cobra, ou para um lisboeta escrever ministro quando ele diz sempre mnistro/e e até diz é Ljboa, da mesma forma que um tripeiro diz que a sua cidade é o puarto?
Caso exemplar é o da língua inglesa. Não conheço bem outras variantes, mas domino razoavelmente as diferenças entre o English UK e o English US (quem lida com computadores sabe o que estou a dizer). No meu primeiro artigo científico, publicado pela U. Oxford, sugeriram-me que alterasse "tumor" para "tumour", mas acrescentando logo que não era qualquer impedimento à publicação. Depois, habituado a publicar numa revista americana, experimentei uma vez escrever "recognise", à inglesa, em vez do americano/canadiano "recognize". Nem um único reparo!
Why can´t we be more like them?
11 dezembro, 2007
Ai, o uisque...
Há dias, mandei a alguns amigos, do meu "inner circle", uma coisa de que gosto muito, "Pela luz dos olhos teus", com a surpresa de me ter sido dito que era cantada pela Ellis e pelo Tom Jobim. Erro, era a Miucha. Parece que a Ellis nunca gravou isto. De volta, um dos amigos mandou-me um "link" para este vídeo delicioso, a versão etílica da canção.
Aos poetas tudo se perdoa
Numa das versões que tenho do "Fado tropical", logo a seguir a cantar "esta terra ainda vai cumprir seu ideal/vai ainda se tornar num imenso Portugal", ele interrompe para uma coisa falada:
"Sabe, no fundo eu sou um sentimental,
Todos nós herdámos no sangue lusitano
Uma boa dosagem de lirismo.
Mesmo quando minhas mãos estão ocupadas
Em torturar, esganar, trucidar,
Meu coração fecha os olhos
E sinceramente chora"
Chico, torturadores de sensibilidade ternurenta? Admito a liberdade poética, mas esta é demais, para quem viveu o regime dos coronéis brasileiros (ou da PIDE portuguesa).
10 dezembro, 2007
Dear Professor Yossi Sheffi, please, please...draw us a picture!
1º - ... "o trabalho com as empresas é importante", não se resumindo à publicação de ensaios, à leitura ou à definição teórica da profissão de engenheiro, que acaba por não dar um contrato de trabalho a ninguém.
2º - "O que interessa o que é ou não a engenharia? Nada. Não interessa qual a etiqueta que se põe no problema, não interessa qual o ensaio que se vai publicar. A única coisa que interessa é a solução para o problema", frisou Sheffi, acrescentando que "esta visão é minoritária" em Portugal. Ah! Pois..., pode crer, nem imagina quanto é minoritária!
Pode ser que, como o Senhor é do MIT, comecemos agora TODOS, a perceber o significado do NADA e a acreditar no conteúdo das suas afirmações mas, mesmo assim, por favor, faça-nos um desenho, so everyone of us can catch-up your whole idea, porque alguns de nós são muito cépticos.... OBRIGADÍSSIMA! Bem haja!
O espírito médico
A medicina está difícil. Os meninos dos 18 valores não são obrigatoriamente as mentes e os afectos médicos. Eu sou autor de uma proposta de um curso de medicina em que me preocupo muito com a formação para a "compassionate medicine". Mas cuidado com a tradução à letra. Não é compaixão caritativa para com o coitadinho do doente, é empatia, partilha fraterna de sentimentos e vivências, a intuição de um gesto de ternura que vale mais do que mil palavras segundo a ordenança e o código.
É por isto que tenho muita pena de não ter sido convidado para o jantar de há dias preparado por cozinheiros infectados com HIV.
08 dezembro, 2007
In memoriam
Desapareceu Stockhausen. Ao menos, que Boulez ainda se mantenha vivo por mais bons anos. E não esqueçamos um grande nome português, Emanuel Nunes.
07 dezembro, 2007
Nota gastronómica (XLIII)
Terminei assim a minha última nota gastronómica: "Fica-me, dito isto, outra pergunta. Mas afinal a alcatra da Terceira é com vinho tinto ou branco? "Ele há cada questão..." Escreverei sobre isto uma próxima nota." É o que vou fazer.
Ao contrário da cozinha francesa, não temos grande tradição de cozinha de vinho (claro que não estou a falar do uso moderado do vinho, em guisados, por exemplo, como tempero). Claro que temos a chanfana, o frango na púcara, o polvo e a molha açorianos, outras coisas mais, mas realce absoluto para a alcatra da Terceira. Suscita uma questão interessante: por razões históricas, mudou um ingrediente essencial, o tipo de vinho. Deve-se aceitar a mudança como definitiva ou deve-se recuperar a origem?
O panorama vitícola açoriano mudou radicalmente no século XIX. Desde tempos imemoriais, não há relevo para o vinho tinto e o grande vinho açoriano é o verdelho, ou como vinho de mesa ou como generoso, com a célebre história de orgulho açoriano de ser o vinho mais importado pela corte russa. Tal como na Madeira, também havia terrantês, bem como arinto, mas em pequena proporção. O cultivo da vinha era característico, em pequenas curraletas limitadas por muros de basalto, como ainda hoje se podem ver no Pico e no excelente museu do vinho dos Biscoitos. No caso dos Biscoitos, menos no Pico, continua ainda a haver uma característica que me agrada imenso, embora haja quem não goste: o verdelho que ainda se produz (Donatário, Da resistência, ambos da casa Brum) tem um ligeiro sabor a maresia, amariscado. Os Açores são "quando o mar galgou a terra".
A filoxera deu cabo de tudo. Incrivelmente, em vez de se seguir ao inevitável arranque das vinhas o replantio com as castas históricas, importou-se a uva Isabel, californiana, porque muito resistente. A partir daí, todo o vinho popular açoriano é o vinho de cheiro (aqui, o chamado morangueiro), coisa execrável. Só poucas casas, principalmente a casa de Chico Maria Brum, é que mantiveram uns resquícios de verdelho. Da mesma forma, só os mais abastados é que bebiam vinho tinto ou branco, ido do continente (em garrafão, como me lembro do Grão Vasco em casa dos meus pais).
Já estou a trescrever, vamos à alcatra. Não conheço nada que date a sua origem, mas é certamente ancestral. É um prato da mais velha técnica culinária, relacionada com as daubes e até com velhas referências a cozinha de vinho dos romanos. O uso generoso da pimenta preta e da Jamaica, em grão, evoca a volta do largo e o comércio das naus das Índias, troca de frescos e de especiarias. Por tudo isto, ponho as minhas mãos no fogo por que a alcatra é muito mais velha do que a filoxera. Então, certamente, a alcatra era feita com verdelho.
Depois, sou do tempo da alcatra dupla, coisa que sempre causou discussão gastronómica familiar. Na minha casa e em muitas outras, a alcatra era feita com vinho branco do continente. No entanto, quando ia em miúdo à Terceira e me fartei de comer alcatra em funções de Espírito Santo por tudo o que era freguesia, era de vinho de cheiro, o vinho de que o povo dispunha. É hábito arreigado. Deve ser consagrado ou deve-se recuperar a história genuína? Honestamente não sei, embora possa dizer é que nunca por nunca faço uma alcatra com vinho de cheiro ou vinho tinto, sempre um bom vinho branco seco (normalmente arinto, de Bucelas).
E verdelho, agora que volta a haver na Terceira verdelho de mesa? Recorda-me alguma tradição familiar. Alcatra era coisa que se fazia com frequência lá em casa, sempre com vinho branco, e creio que era uma alcatra inegualável, que nunca vi primor de papilas gustativas como as da minha avó. Havia excepção para a alcatra do dia de Espírito Santo, alcatra de vinho dos Biscoitos. Não podia ser todas as vezes, por falta do vinho, mas, indo com alguma frequência a Angra, o meu pai aviava-se com umas garrafas, das quais parte se destinava obrigatoriamente à alcatra.
Com tudo isto, conclusão inevitável, um compromisso aceitável. Não há produção de verdelho que dê para todas as alcatras da Terceira, continuem a fazê-las com vinho de cheiro. Que as casas de maior recordação senhorial usem um bom vinho branco, como eu. Mas se a quiserem valorizar ao máximo, como se diz neste escrito que o Luís Brum me mandou, verdelho! Eu é que fico em dificuldade pessoal, porque tenho forte relutância em usar que não para beber as ofertas que recebo de Donatário.
06 dezembro, 2007
Ainda o aborto
"E todos os médicos sabem, hoje, que a chamada 'interrupção voluntária da gravidez' causa, frequentemente, sofrimentos à mulher: aumenta em 30% o risco de cancro da mama, gera depressões, disfunção sexual, esterilidade, tendência para aborto espontâneo, etc. - males que os médicos têm o dever de tratar e prevenir."
Fiquei siderado. Nada do que eu penso em relação ao aborto se pode sobrepor a estes factos. Mas fez-se-me uma centelha de lucidez e, à minha maneira de velho profissional da ciência, comecei logo por ir ver quais eram as credenciais científicas do autor. É Luís Brito Correia, advogado e ex-mandatário da Plataforma Não Obrigado. Ufa! Que alívio...
05 dezembro, 2007
Piões para porta-aviões?
Fartamo-nos todos de ouvir muitas litânias, imprecações, rezas, lamentações e pragas do canhoto, sobre os drifts das instituições politécnicas públicas. Drifts estes que, valha-nos a verdade, o MINISTÉRIO DA CIÊNCIA, TECNOLOGIA E ENSINO SUPERIOR (MCTES) fez (e bem) das tripas coração acautelar, pelo Decreto-Lei n.o 74/2006.
Mas, de entre as multiplas amnésias, deste Ministério e deste Decreto, está precisamente a ausência de prevenção de drifts das Universidades em relação aos Politécnicos. Como também sou distraídíssima, tem toda a minha solidariedade e compreensão.
Mas, às vezes as nossas distrações têm os seus inconvenientes:
Podem crer, eu hoje pasmei com uma notícia do Público - esta, de onde extraí a seguinte informação - "O Senado da Universidade Técnica de Lisboa aprovou ontem as Licenciaturas de Cenografia e Enfermagem Veterinária, as primeiras do género em univerisades em Portugal, que poderão arrancar em Setembro de 2008, revelou o reitor, Fernando Ramôa Ribeiro."O Senhor Reitor, a quem por acaso até admiro muitíssimo, admirou-me ainda mais quando nos explicou a decisão: "São áreas recentes na Europa, uma grande carência que temos". ????!!!!!!!????
Ora bem, na Europa, se calhar, são áreas recentes, mas em Portugal, já em 2006:
- nada menos que em 4 Politécnicos -- CASTELO BRANCO, ELVAS, PONTE DE LIMA e VISEU -- inscreveram-se respectivamente 30, 47, 27 e 63 alunos aproveitando a totalidade das vagas dos cursos de "Enfermagem Veterinária" que ofereceram, e tendo também um total de alunos inscritos, neste preciso ano lectivo, pela mesma ordem de 30, 138, 27 e 154 alunos.
Não sei a idade de BI destes cursos todos, mas sei que a Ordem dos Enfermeiros (aqui) já em Julho de 2004, protestou contra a ideia INOVADORA -- nesta altura, em Portugal sim, foi uma ideia inovadora da Escola Superior Agrária de Elvas -- nestes termos: «Neste sentido, a Ordem dos Enfermeiros já solicitou ao Ministério da Ciência e Ensino Superior a alteração da Portaria que cria o curso de bacharelato em enfermagem veterinária na Escola Superior Agrária de Elvas, retirando a palavra "enfermagem"».??!!!????
No entanto, pode ser que agora a Ordem dos Enfermeiros, tratando-se de um curso da Universidade de Lisboa, já ache bem o nome... e não queiram mais recuperar um nome "alternativo" que propuseram - "auxiliar de veterinário"
- não tenho bem a certeza, mas penso que já existia também um Curso de Cinema, com um ramo em Design de Cena, no Instituto Politécnico de Lisboa, com 56 alunos inscritos, em 2006/2007. Bom, é bem verdade que não é um curso de Cenografia, mas... Que será que se ensina-aprende nesse curso de Design de Cena?
Do meu lado, começo a pensar que é triste mas, sobretudo, caríssimo ao país quando os nossos porta-aviões se metem também a fazer "cavalos de pau", perdão, piões... Os meus leitores discordam de mim?
OK! Somos todos livres para pensarmos mas, eu continuo a dizer que era muito mais simples e pacificador, para Portugal, deitarmos fora todos os diplomas legais da nossa educação superior, que seriam substituídos por uma simples meia folha A4, com a devida chancela, com uma única frase que diria mais ou menos seguinte: "A partir de hoje, tudo o que deveria ser feito por uns, passa a ser feito pelos outros!".
Como opção, a tal redacção tutelante poderia ser também assim: "A partir de hoje, e à semelhança das nossas Universidades, aquelas outras instituições - em off, e para o secretariado: como é que me dizem que é mesmo o nome daquelas 'coisas'? Poli...? Poli...quê? Ah! Pois... isso, escrevam - Politécnicas também podem fazer tudo o que lhes vier às ideias!"
04 dezembro, 2007
Shmoo
Hoje, vou-lhes falar de shmoos - o "shmoo", sem c antes do h, é o colapso da espuma de cerveja que resulta em apreciações individuais distintas e opostas: é altamente negativa ou positiva, em dois momentos distintos do processo de produção e de consumo da cerveja em causa - pode tornar-se uma seríssima dor de cabeça durante a fermentação (ficamos com espuma de cerveja espalhada, até na alma dos porões da fábrica, até à altura dos joelhos), susceptível de causar surtos de pressão arterial maligna, levando a acometimentos de AVC, nos mestres cervejeiros mais fleumáticos e, simultaneamente, é uma das maiores delícias para uma boa parte dos apreciadores de cerveja (aqueles que gostam de "golas altas", durante a degustação da bebida, que nos deixam os bigodes pincelados com aquela espumazinha branca, que nos obriga a lamber os beiços - apre, que imagem...).
Ora é assim mesmo, tal e qual como o shmoo, o efeito da postura da Direcção Geral de Ensino Superior (DGES), sobre as instituições que tutela. Não sei se deram por isso, mas no famigerado dia 15 de Novembro de 2007, neste endereço da página da DGES publicou-se o seguinte texto-aviso:
"Por despacho do Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior de 24-10-2007
(Despacho n.º 26245/2007, DR, 2.ª série, de 15-11), foi fixada a data de 28 de Dezembro de 2007 para a apresentação, na Direcção-Geral do Ensino Superior, de pedidos referentes ao registo de adequação, à autorização de funcionamento de novas formações e ao registo de alterações, para a entrada em funcionamento no ano lectivo de 2008/2009."
Com essa frase, mas de uma outra maneira, a nossa gestão de cúpula da educação superior diz-nos, exactamente, o seguinte: "o que se passa com as propostas velhas e safadas de novas formações superiores, submetidas pelas instituições no passado ano 2006 (a nível de mestrado), "achamos" que sabemos o que é que lhes aconteceu, mas não dizemos a ninguém, e as instituições que, assim o entenderem, mesmo que ignorem o paradeiro das suas propostas do ano passado, sigam o nosso exemplo e tradição, em estratégia: planeiem o futuro como muito bem lhes parecer porque, depois, estamos cá nós para ver o que irão, eventualmente, fazer ou não, e também só decidiremos quando e o que quer nos der na régia gana".
Claro que, há instituições que apreciam e vibram, muitíssimo, com shmoos como estes que vos acabei de descrever e, naturalmente, há as outras em que alunos e docentes, perante tais shmoos, entram em risco de vida profissional. Mas, e isso... interessa lá a alguém?!
03 dezembro, 2007
Interrupção
02 dezembro, 2007
Nota gastronómica (XLII)
Com alguma publicidade mas ainda maior privacidade, David Lopes Ramos e eu temos mantido correspondência gastronómica assídua. Consideração mútua, mas que só se alimenta com uns pozinhos de polémica cordial, como agora. E até nem se trata bem de uma crítica, mais uma dúvida.
Vem a propósito de um tema que me é muito caro, a cozinha de vinho (não fosse eu especialista em alcatra terceirense) e da sua crónica de ontem no Público, sugerindo uma alcatra de coelho. Aliás, provavelmente por coincidência, há um restaurante muito respeitável em S. Miguel, o Gato Mia, que faz essa alcatra, que ainda não comi.
A cozinha com vinho branco é banal. Num guisado, é juntar e deixar ir. Para um aveludado, uma redução de vinho branco, durante 3-5 minutos com chalotas, ervas ou uma duxelles de cogumelos nunca me deixou mal. Com um gole de moscatel ou verdelho, melhor ainda.
O vinho tinto, este sim é que é difícil. Regra essencial, para qualquer vinho, é tempo e temperatura para evaporar todo o álcool. Mas o tinto tem taninos que precisam de ser suavizados, senão qualquer cozinhado sabe a sopas de cavalo cansado. Nisto, a confecção tem tudo o que se lhe diga. Exemplifico com o polvo guisado à açoriana. Pouco mais do que uma hora de cozedura, o vinho apurado ao ponto certo, porque a alta temperatura e com ebulição forte. Assado é diferente. Experimentem o polvo assado em vinho tinto, que sai frequentemente agreste, com sabor a vinho. Ou então, para evitar o problema do vinho, assadura de mais e o polvo encortiçado.
E porque é que se faz "coq au vin" e não "poulet au vin"? E porque é que a nossa excelente chanfana só pode ser feita com cabra velha? Experimentem fazer uma chanfana de cabrito e depois mandem-me notícias. Leiam o mestre Escoffier quanto às daubes. Provençal e borguinhesa, de carne de boi, muito bem, no forno, recipiente vedado, assadura lenta. Mas já a daube de cordeiro ou a de peru são em forno a temperatura mais baixa, permitindo assadura muito lenta, e com as carnes previamente marinadas, a ganhar sabor. O grande desafio da cozinha de vinho tinto é tempo e temperatura para cozer o vinho sem as carnes se desfazerem.
Muito mais importante é isto nos assados. A temperatura é enganadora. Ponham o forno a 200º, depois meçam a temperatura do molho de uma alcatra, por exemplo. Pouco ultrapassa os 120º, é um ligeiro fervilhar. Por alguma razão uma alcatra demora cerca de 6 horas a assar. Ao fim deste tempo, o vinho está no ponto certo. Mas pode-se deixar coelho a assar durante 6 horas? Se sim, a que temperatura, não certamente a da alcatra de carne? E durante quanto tempo? Não quero dizer com isto que discorde desta ideia de alcatra de coelho, mas desconfio de que é coisa que exige algum cuidado.
Fica-me, dito isto, outra pergunta. Mas afinal a alcatra da Terceira é com vinho tinto ou branco? "Ele há cada questão..." Escreverei sobre isto uma próxima nota.
P. S. (17:30) - Reparo agora que fui injusto para com DLR. Escrevi esta nota sem ter ao lado a sua crónica. Afinal, DLR responde em pormenor às perguntas que fiz. Por isto, pensei apagar esta nota, masa é melhor deixá-la, com este esclarecimento, porque aborda uma questão culinária relevante.
01 dezembro, 2007
Quem muito escreve muito erra
O que o articulista deveria era ter-se informado melhor. A Constituição de 1976 não impõe nenhum referendo. As únicas limitações à criação das regiões são a obrigatoriedade da criação simultânea e o voto favorável da maioria das assembleias municipais representativas da maioria da população regional (artº 256º). Isto só foi alterado, com a introdução da obrigação referendária, na revisão constitucional de 1997, por acordo entre Guterres e Marcelo Rebelo de Sousa, o que resultou, no ano seguinte, na rejeição referendária da criação das regiões.
MST devia estudar um pouco melhor os assuntos sobre os quais opina. E não ter a arrogância de pensar que todos partilham da sua ignorância e que ninguém é capaz de dizer que o rei vai nu.