02 dezembro, 2006

Em época de crise

Entre o sério e a brincadeira, a contenção não podia começar pela dimensão do governo? Ainda hoje (dia desta escrita) vi a reportagem da cimeira luso-espanhola, e lá estava a ministra espanhola da Educação e da Ciência. Ao lado, o ministro português da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. Isto é pecha portuguesa, não há sector corporativo que não se queira ver representado a nível de ministério. E mesmo ministérios pequeninos, como esse ou o da cultura, não dispensam um secretário de Estado. Não será apenas, como uma vez disse Cavaco, com infelicidade (?), ajudante do ministro? Até há casos bizarros e crípticos, por exemplo, Secretário de Estado da Saúde
 e Secretária de Estado Adjunta e da Saúde. Porque não um Secretário de Estado Ajunto da Secretária de Estado Adjunta?

Não podia deixar de falar do meu sector de estimação, a educação. Temos dois ministérios, a Espanha só tem um, a Inglaterra também (associando a formação profissional), a Holanda tem um ministério da educação, cultura e ciência, muitos outros exemplos.

Aqui vai o que seria um governo à nossa medida, respeitando os ministérios tradicionais e com simbolismo da soberania, seguidos das suas áreas de influência, eventualmente secretarias de Estado.

• Presidência > Assuntos parlamentares
• Defesa
• Negócios estrangeiros
• Justiça
• Administração interna > Autarquias / Segurança / Função pública
• Finanças > Tesouro / Orçamento
• Economia > Indústria / Comércio / Agricultura e pescas / Turismo / Inovação e tecnologia
• Educação e cultura > Educação básica e secundária / Educação superior / Ciência / Cultura
• Saúde
• Assuntos sociais > Trabalho / Segurança social / Formação profissional
• Equipamento > Obras públicas / Transportes / Comunicações

Tenho dúvidas quanto ao Ordenamento e ambiente. É difícil meter este sector juntamente com outros que representam os maiores predadores (autarquias, indústria, agricultura, etc.).

Em conclusão, um governo de pequeno pais, 11 ministros e 21 secretários de Estado. Hoje temos 16 ministros e 30 secretários de Estado. Em chefes de gabinete, adjuntos, assessores, secretárias, motoristas, cartões de crédito, despesas de representação, faz alguma diferença. Não é altura de, na sua luta contra os privilégios, Sócrates falar nos privilégios do governo?

Mais sério é que isto traduz uma lógica de governação. Em muitos países, o governante tem a seu cargo apenas a orientação e decisão política final. O seu staff até pode não ter funções governamentais. Desconfio, por muito que conheço da administração pública, que entre nós há uma cadeia de despromoção. De facto, os ministros, despachando trivialidades, são secretários de Estado, estes são directores-gerais e os directores-gerais são chefes de repartição. Em que é que ocupam o dia a Ministra da Cultura e o seu Secretário de Estado? Gostava de saber. Para que precisa Mariano Gago de um Secretário de Estado?

3 comentários:

M.C.R. disse...

Começo, a exemplo do meu colega de curso JM Júdice, por uma declaração de interesses: trabalhei sete anos no Ministério da Cultura (que curiosamente ainda só era secretaria de estado, ligada á Presidencia do Conselho de Ministros) e aí desempenhei funções de chefia intermédia e de direcção ou sub-direcção geral.
dito isto e indo ao essencial entendo errado e despropositado incluir o sector cultura no Ministério da Educação. Não que isso signifique menosprezo pelo segundo nada disso mas apenas porque se aplicam claramente a sectores diferentes de interesses nacionais. são mundos completamente diversos sobretudo no que diz respeito -e só a título de exemplo - aos sectores criação e património. Poderia é verdade falar igualmente das especificidades dos Teatros Nacionais, da Ópera ou das Orquestras também nacionais. Não que advogue para um país do nosso tamanho e da nossa população (inferior à de Paris, area de influencia incluída).
Tenho para mim que uma das maiores dificuldades com que sempre se defrontou o sector "cultura" é o pensar-se que ela prossegue sequer longinquamente objectivos comuns, parecidos ou identificados com o sector Educação. Talvez por isso mesmo, e voltando à comparação que JVC faz com a Europa, não se conheça um único estrado em que os dois sectores se confundam no mesmo ministério.
que obviamente se pense que sem Educação formal é pouca a cultura ainda aceito se bem que mesmoi aqui fiquemos sem saber como e porque se fala em cultura popular, em arte popular, em teatro popular, em música popular e por aí fora. De facto e bastaria citar Giacometti/ Lopes graça para (lamentando o estado actual da pesquisa por eles iniciada) verifiicarmos que estamos perante um manancial de formulas musicais que se perdem (e algumas já se perderam de todo para desgraça nossa) na noite dos tempos e que dificilmente caberão em qualquer departamento de educação.
A questão património (e so refiro o arqueológico e o construído mesmo sabendo que o segundo pode englobar o primeiro) é outra que põe á prova aquilo que parece ser o veio motor da educação.
sou favoravel não só a uma redução de Ministérios ede departamentos centrais mas sobreutdo á manutenção dos seus nomes coisa mesquinha porventura mas de preço elevado e consequencias sempre desastrosas pelo que implica de negociação entre diferentes e novos ministérios quanto aos organismos a tutelar. Isto quando não acontece coexistirem depois indefinidamente, como se sabe.
costumo dizer que de há quase qurenta anos a esta parte passo diante de vários ministérios franceses quando estou em Paris: nunca os vi mudar de nome e raríssimas vezes dei porque estivessem á mercê de alterações organicas a cada governo que aparece. Cá é o que se sabe: neste momento ainda há ministérios a aprovar leis orgânicas e já estamos praticamente a meio do mandato!
sou igualmente avesso à proliferação de direcções gerais e mais ainda de Institutos que normalmente são direcções gerais disfarçadas que pagam melhor os seus dirigentes (escolhidos como se sabe peelo cartãozinho atempadamente requerido na sede do partido do poder).
Todavia não me repugna que sectores diferenciados tenham cada um a sua central o que não significa longe disso uma direcção geral. O que me parece disparatado é agarrar em serviços exemplares e ligarem-nos forçosamente a outros para fingir que assim se poupa. não se poupa e muitas vezes criam-se monstros ingovernáveis (com ou sem funcionários públicos! Que isso do vínculo é mera treta: o que se passa é que com a dança política das cadeiras e dos responsáveis a situação do serviço degrada-se, desvia-se e ninguém está disposto a pôr-lhe um freio) Veja-se como mero exemplo o triste fim da Direcção Geral dos Edificios e Monumentos Nacionais. durante décadas funcionou não direi exemplarmente mas bastante bem. Tinha um corpo reduzido mas actuante de técnicods capazes, sérios e conceituados. foi devorada como se sabe por um monstro que sempre foi um abismo. alguém acredita que as coisas deste sector irão melhorar a curto prazo?
Como comentário isto está excessivo pelo que por aqui me fico. À espera de outros leitores que queiram também debater este penoso assunto.

M.C.R. disse...

só um exclarecimento: há um período do meu texto que ficou incompleto, De facro deverá ler-se que não advogo para o país uma multiplicidade de óperas, orquestras e teatro nacionais. Nem tão pouco quero mais museus nacionais ou outra cinemateca. O país é pequeno e há meios mais baratos de fazer chegar o produto destas instituições a todo o lugar.

JVC disse...

Marcelo, aqui vai uma provocação. Pode haver um bom ministro da educação que não seja também um bom ministro da cultura? O que é a educação sem a cultura e vice-versa? "That´s all the man, stupid".