Cavaco parece não ter tido dúvidas sobre a constitucionalidade da lei. Desde já alerto para o que me disse um advogado, que, formalmente, se o PS consentir em alterar uma palavra, a lei passa a ser outra e Cavaco passa também a poder enviá-la para o TC, a empatar. Ou até a devolvê-la novamente ao parlamento. A meu ver, seria um escândalo de brincadeira com os mecanismos constitucionais. O veto parece-me indiscutivelmente de ordem ideológica. É talvez o primeiro caso em que se vê o que foi votar em Cavaco, porque estou certo de que Alegre e Soares nunca vetariam esta lei. Constitui também um precedente perigoso. Até agora, os vetos tinham como fundamento a defesa do sistema democrático, do funcionamento dos órgãos do Estado ou da garantia dos direitos consagrados constitucionalmente. Este tem obviamente uma relação estreita com as convicções morais do cidadão Cavaco, coisa diferente do PR Cavaco.
Perdi uma aposta com um amigo que me disse estar convencido de que Cavaco vetaria a lei. Retorqui-lhe que, como foi das remodelações dos seus governos, a melhor forma de condicionar negativamente o homem é pressioná-lo. Enganei-me. Afinal, agora, não teve rebuços em aparecer como seguidor da Igreja e de outros círculos conservadores. Pode-se dizer que os seus motivos para o veto são só jurídicos. Ingenuidade, é só ler bem a argumentação por vezes até aberrante (como o caso das mulheres vítimas de violência que não querem o divórcio).
Não sei o que se vai passar, quando e com que prioridade agendará o PS a rediscussão da lei, até onde cederá. Palpita-me que vai ceder em alguma coisa, mas não no essencial, naquilo que hoje já é consenso da legislação europeia, o fim da noção de culpa e do consequente divórcio litigioso. Neste caso, também me palpita que uma das reuniões de quinta feira em Belém chegará a um entendimento em que ambas as partes salvem a face. Teria sido escusado todo este imbrolho.
Também é relevante, a este propósito, lembrar a posição da Igreja católica, com um aspecto muito significante que não se ouvia há muito. Frequentemente, a Igreja invoca posições morais ou ideológicas para se opor a leis ou políticas. Está no seu direito, desde que se coloque em igual posição a qualquer outra corrente de influência. Desta vez, há uma novidade inaceitável. O porta-voz da conferência episcopal declarou que a Igreja estava contra a lei por ela ser contra a religião! Fico à espera que o Sr. Pinto da Costa aproveite a onda e proteste contra qualquer lei por ela ser contra o Futebol Club do Porto. Tem a mesma "legitimidade".
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