Nos meus dois anos de vida em Angola, entre 1970 e 1972, impus-me a regra de tentar fazer desse prejuízo para a minha vida profissional e familiar um desafio a ficar-me na memória aquela terra. Acho que consegui, ainda hoje me sinto muito angolano, contraste extremo com ser muito açoriano. Entre muitas coisas desse aproveitar Angola, destaca-se a conquista de amizades com gente notável, de muitos e variados tipos, brancos e pretos, elite e povo.
Um foi o “velho”, exemplo de qualidade intelectual e moral, de juventude e abertura de espírito. A minha então mulher, sua colega jovem de ofício, trabalhou com ele e partilhava comigo a admiração por esse homem que já é altura de identificar: Vasco Vieira da Costa, arquitecto, radicado em Angola há muitos anos, depois de um percurso profissional notável que incluiu um estágio com Le Corbusier.
Não sou arquitecto, mas é arte que me fascina e em que julgo poder opinar acertadamente. Costumo dizer que, ao contrário do turista das compras que só olha para o rés-do-chão, as cidades só me provocam o olhar a partir do 1º andar. Ora, da influência de Corbusier em Portugal, fora o Hotel Casino no Funchal e o casino, do seu discípulo Niemeyer, ressalta o mercado do Kinaxixi (Quinachiche) em Luanda, com a demais-valia de um excelente trabalho de adaptação ao calor e à luz tropical.
É esta obra que está a ser demolida. Protesto, com a autoridade de sempre ter tido uma posição anticolonial e de me ter batido publicamente por ela. Isto não significa uma concordância acéfala, se calhar complexada, como me parece ver em muitos casos, com o desprezo dos novos países pela obra que os portugueses lá fizeram e que deve fazer parte do seu património cultural. Os pecados da dominação política, da exploração económica, não devem escamotear o que se deixou de bom, inclusivamente como, neste caso, feito por homens que se opunham ao colonialismo. E eu testemunho isto, meu caro “velho”, como lhe chamava sempre o nosso comum amigo Valério.
06 agosto, 2008
Arte colonialista?
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1 comentário:
Viver em Angola e saborear cada minuto, tanto em momentos de guerra como de paz, (nos tempos coloniais), é irrepetivel.
E tudo o que não é possível repetir, é melhor que se desintegre e fique apenas nos sonhos de quem tem ou teve capacidade de sonhar.
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