1. A crise no Irão está a originar artigos, notícias e colunas dando uma no cravo e outra na ferradura. Insiste-se na necessidade de conversações bilaterais, em posições e sanções da ONU. Mas, pelo meio, vêm as ameaças de intervenção militar. Começo por deixar claro que não simpatizo nada com o regime iraniano e que não vou na conversa, à PCP ou BE, de que o programa nuclear "pacífico" do Irão não representa nenhuma ameaça à paz mundial. Mas lembro o Iraque. Ninguém aprendeu? E, comparado, o Irão, militarmente, não é pêra doce.
A acompanhar uma notícia, o jornal publica uma infografia de origem americana com alvos, armas, aviões. É para, subliminarmente, irem preparando os leitores?
2. Foi lançado um livro de Livro de Maria Inácia Rezola que desmonta algumas ideias feitas sobre o 25 de Abril, nomeadamente sobre a "prepotência" do Conselho da Revolução. Há uma passagem da notícia que me interessou:
"O livro revela ainda "a descrença de Álvaro Cunhal no V Governo provisório. Desde muito cedo que ele [o histórico secretário-geral do PCP] ensaiou uma demarcação de Vasco Gonçalves para se aproximar dos militares moderados", frisou ainda António Reis. "É verdade e posso testemunhá-lo. Tenho mesmo boas razões para supor que, para além destes contactos de "mensageiros de base", houve conversas ao mais alto nível, mas não posso garantir. Também é sabido que, no verão quente, regressado da sua hospitalização – ou férias, já não me lembro bem – em Moscovo, Cunhal "puxou as orelhas" aos seus camaradas dirigentes, alinhados entretanto na frente esquerdista. Mais ainda, os responsáveis por células foram instruídos para transmitirem moderação em relação à rejeição de base de um possível e frustrado governo Fabião. Mas também é verdade que Cunhal jogou em dois tabuleiros e que os conhecidos membros do V Governo comunistas ou próximos nunca o teriam sido sem a sua concordância.
Daí também a prudência do PCP no dia 25 de Novembro.
3. Na última página, vem a notícia de uma senhora de 63 anos que está grávida, por inseminação artificial, depois de um tratamento que lhe repôs (?) a sua fisiologia pré-menopáusica. É por estas e outras que hoje há tanta desconfiança pública em relação às magníficas conquistas da biomedicina reprodutiva. São médicos e cientistas, frequentemente, os piores malfeitores à sua ciência e arte. Não brinquem com a natureza!
4. Ainda na última página, fez-me pensar a crónica habitual de Vasco Pulido Valente. Como de costume, niilista, derrotista, sobranceiro. Mas não será que este retrato secular de Portugal que ele e outros (Barreto, Mónica, Bonifácio, etc.) transmitem não será visto, daqui a cem anos, como hoje lemos os escritos da geração de 70? Em parte sim. Lamento prensar que, nesse futuro, talvez ainda se continuem a reconhecer como reais, com a mesma actualidade, Gouvarinhos, Acácios, Pachecos, Abranhos, Cavalões, até (agora mais na moda) Salcedes, acrescentados dos seus sucessores dos tempos que correm. Também os iluminados que não lutam e que são objectivamente cúmplices, Carlos Eduardo, João da Ega, Fradique, Craft (mas, enfim, este era estrangeiro).
No entanto, há uma grande diferença, a da intervenção, sua forma e qualidade. É certo que a intervenção prática da geração de 70, exceptuando as de Antero, quando a doença lho permitia e a passagem malograda de Oliveira Martins pelo governo, foram fugazes. No entanto, mesmo em relação aos outros, lembremo-nos que actuaram pela positiva, principalmente como escritores, obviamente que com realce para Eça. As Farpas, os Maias, Fradique não são apenas um choro, revelam autores que têm um sonho e uma atutude de progresso, que não precisam de formular explicitamente. Ganharam autoridade intelectual para que muita gente se interesse pelas ideias de progresso que saltam da critica. Os nossos actuais derrotistas têm a mesma autoridade intelectual?
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