11 março, 2006

A importância de se ser "earnest"

Há dias, ao traduzir um texto de Berverly Trayner, deparei-me como uma grande dificuldade: como traduzir "earnestness"? Isto fez-me pensar em como a língua traduz em muito as idiossincrasias psicológicas e culturais do seu povo falante. Também temos as nossas: saudade, desenrascar, não são linearmente traduzíveis por "nostalgy" ou "to improvise". "Alone" também não atende ao valor do sufixo de sozinho. Por alguma razão temos duas palavras, só e sozinho.

Como é bem sabido, uma peça importante, e deciosa, de Oscar Wilde intitula-se "The importance of being earnest", fazendo um trocadilho com o nome Ernest da personagem. Geralmente, traduziu-se para português como "A importância de se chamar Ernesto", o que anula completamente o trocadilho e o significado. Releia-se a peça e logo se vê.

O Webster define o adjectivo "earnest" como "characterized by or proceeding from an intense and serious state of mind". O Dicionário Inglês-Português da Texto Editora traduz por um conjunto de termos que não são obrigatoriamente sinónimos: "sério, diligente, sincero, cuidadoso, zeloso". Poder-se-ia continuar com "dedicado, motivado" e mais. Tanto quanto conheço os meus amigos ingleses que se consideram "earnest", são tudo isto.

Cinjamo-nos ao "sério" e note-se a diferença. Em português, parece-me denotar mais uma atitude ou um temperamento. Facilmente se associa a sisudo, circunspecto, distante do humor. Raramente a sinceridade e nem sempre a motivação. Ora eu conheço muita gente "earnest" que é alegre e divertida.

O resultado prático da minha dificuldade foi a minha amiga Beverly ter modificado o seu texto e, em vez de "earnestness", acabei por traduzir, muito mais facilmente, o que ela acabou por escrever, desdobrando a palavra: "candour, enthusiasm and a sense of humour".

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